segunda-feira, 15 de março de 2010

NOVOS POETAS (II): FABRÍCIO CLEMENTE

CONVALESCÊNCIA

O céu se esfarinha como as asas dos lençóis

Estamos destilando desde as docas do desejo

Um berro de alumínio Um leque de luas lapidado

Estamos conspirando contra cornucópias de colírios

E tomates de insulto em lepra flamejando

Nas horas de angústia contra os corredores

Desfiam-se os coices de outra alma morta

Tênis da primavera em janela de hospital

Aceno sanguíneo

Aceno sanguíneo

Ave de rapina

Cavalo Rosácea

Cavalo Rosácea

Pirata possesso

Ave-estilingue no brilho da manhã

Ave desavisada

Ave cansada

Vício vigor

Ave de lava

Com gládio de glande na gleba sem glosa

Os dias num carrinho de mão imantado de máscaras

Róseo resultado desta equação

Os dias, coração de acasos, culminando em lupa

Por sobre estes pomares de vísceras acesas

A casa porta e coronária

Rebocada

Pelo cuspe do colibri


OLHO AMADO

Agora, para manter-me no mundo será preciso assumir a sanha surda da soberba, o riso; escárnio assírio do palhaço sob a vertigem-guilhotina. Vejo os dias escorrerem pelo vão da janela, fechada, sobre a minha sugestão de alma, e as promessas assistem armários prenhes de pesadelo. Há sombras à espreita nos castelos que jazem latejando sobre os furúnculos da Terra-Mãe. Estou cansado, porém, somente persistindo na masturbação poderei alcançar tua imagem de atlas túrgido consubstanciando-me no sangue que tuas garras arrancaram do cetim que agasalha o planeta. Os arbustos, espiões do terremoto, confinam e confidenciam que há corvos coroando querubins enquanto a espada divina sai surtando numa busca galopante de gafanhotos rumo às têmporas do meu tempo.
(Confiram mais poemas de Fabrício Clemente na Zunái.)

Um comentário:

  1. O Fabrício eu já conhecia da Zunai. Ele faz um exame todo diferente do cotidiano - o que não significa que sua poesia seja banal, muito pelo contrário: ele tem um cinismo de quem quer que terceiros testem, com seus próprios sentidos, o mundo derredor.

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