terça-feira, 29 de maio de 2012

GALERIA: GUNTER GRASS


Em novo poema, Günter Grass defende a Grécia e critica postura da UE


Após ser considerado persona non grata em Israel em razão de um poema em que culpava aquele país por ameaçar a paz mundial, o escritor alemão Günter Grass volta a abordar, de forma crítica, temas de ordem política. Dessa vez, em “A Vergonha da Europa”, ele critica a União Europeia pelas medidas que tem sido tomadas em relação à Grécia, epicentro da crise da dívida financeira que atinge o continente.

“Humilhado, porque crivado de dívidas, um país sofre”, escreve Grass em um poema de dois versos e 12 estrofes, publicado na edição de sábado do jornal alemão Süddeutsche Zeitung.

No poema, o escritor, tido como uma espécie de “consciência moral” da Alemanha, dialoga diretamente com a Europa: “Tu afastas-te do país que foi teu berço, próximo do caos, porque este não serve aos mercados (...) Tu vais definhar privada de alma sem o país que te concebeu, tu, Europa".

A UE (União Europeia), segundo o ganhador do prêmio Nobel de leiteratura em 1999, coloca o berço do pensamento europeu na berlinda, e transforma a Grécia em uma mera devedora, condenando-a à pobreza e classificando-a como “sucata”, “um país que quase não é mais tolerado”. Em seu país, na Alemanha, 60% da população é favorável a que os gregos deixem a zona do euro.
 
No final do poema, Grass afirma que os vizinhos obrigam Atenas a tomar um copo envenenado (simbologia para as medidas de austeridade fiscal impostas pela UE em troca de novos empréstimos). “Beba de uma vez,beba! gritam os comissários em claque, mas Sócrates lhes devolve irado a taça cheia”, diz o escritor, em referência ao filósofo grego que, após ser condenado à morte, tomou um copo envenenado de cicuta, tomando seu destino pelas próprias mãos.

No início de abril, Grass já havia desencadeado uma onda de indignação com a publicação do poema “O que precisa ser dito”. Publicado em jornais de toda a Europa, o poema causou revolta tanto em setores de direita como de esquerda em Israel, que o classificaram de antissemita, e o proibiu de entrar no país. Ele acusa Israel de colocar a paz mundial em risco em função de seu poderio nuclear. Segundo o escritor, o Irã encontra-se ameaçado pela posição nuclear supostamente preventiva de Israel, que poderia exterminar a população iraniana.

"O que critico é uma política que continua construindo assentamentos em desrespeito a uma resolução das Nações Unidas. Critico una política que se baseia cada vez mais em inimigos e que isola gradativamente o país. O homem que atualmente causa mais dano a Israel é, em minha opinião, (o premiê Benjamin) Netanyahu. E, por isso deveria tê-lo incluído no poema”, disse Grass, na ocasião, em sua defesa.

(Matéria publicada originalmente no site Opera Mundi)


domingo, 27 de maio de 2012

GALERIA: OSWALD DE ANDRADE


UM POEMA DE OSWALD DE ANDRADE



 oferta

Saibam quantos este meu verso virem
Que te amo
Do amor maior
Que possível for

 canção e calendário

Sol de montanha
Sol esquivo de montanha
Felicidade
Teu nome é
Maria Antonieta d'Alkmin

No fundo do poço
No cimo do monte
No poço sem fundo
Na ponte quebrada
No rego da fonte
Na ponta da lança
No monte profundo
Nevada
Entre os crimes contra mim
Maria Antonieta d'Alkmin

Felicidade forjada nas trevas
Entre os crimes contra mim
Sol de montanha
Maria Antonieta d'Alkmin

Não quero mais as moreninhas de Macedo
Não quero mais as namoradas
Do senhor poeta
Alberto d'Oliveira
Quero você Não quero mais
Crucificadas em meus cabelos
Quero você

Não quero mais
A inglesa Elena
Não quero mais
A irmã da Nena
Não quero mais
A bela Elena
Anabela
Ana Bolena
Quero você

Toma conta do céu
Toma conta da terra
Toma conta do mar
Toma conta de mim
Maria Antonieta d'Alkmin

E se ele vier
Defenderei
E se ela vier
Defenderei
E se eles vierem
Defenderei
E se elas vierem todas
Numa guirlanda de flechas
Defenderei
Defenderei
Defenderei

Cais de minha vida
Partida sete vezes
Cais de minha vida quebrada
Nas prisões
Suada nas ruas
Modelada
Na aurora indecisa dos hospitais

Bonançosa bonança.

(Do livro Cântico dos Cânticos para flauta e violão)

sexta-feira, 25 de maio de 2012

GALERIA: MÁRIO FAUSTINO


POEMAS DE MÁRIO FAUSTINO


VIDA TODA LINGUAGEM

Vida toda linguagem,
frase perfeita sempre, talvez verso,
geralmente sem qualquer adjetivo,
coluna sem ornamento, geralmente partida.
Vida toda linguagem,
há entretanto um verbo, um verbo sempre, e um nome
aqui, ali, assegurando a perfeição
eterna do período, talvez verso,
talvez interjetivo, verso, verso.
Vida toda linguagem,
feto sugando em língua compassiva
o sangue que criança espalhará - oh metáfora ativa!
leite jorrado em fonte adolescente,
sêmen de homens maduros, verbo, verbo.
Vida toda linguagem,
bem o conhecem velhos que repetem,
contra negras janelas, cintilantes imagens
que lhes estrelam turvas trajetórias.
Vida toda linguagem --
                                     como todos sabemos
conjugar esses verbos, nomear
esses nomes:
                       amar, fazer, destruir,
homem, mulher e besta, diabo e anjo
E deus talvez, e nada
Vida toda linguagem,
vida sempre perfeita,
imperfeitos somente os vocábulos mortos
com que um homem jovem, nos terraços do inverno, con-
[tra a chuva,
tenta fazê-la enterna - com se lhe faltasse
outra, imortal sintaxe
à vida que é perfeita
                                 língua
                                     eterna.


SINTO QUE O MÊS PRESENTE ME ASSASSINA

Sinto que o mês presente me assassina,
As aves atuais nasceram mudas
E o tempo na verdade tem domínio
Sobre homens nus ao sul de luas curvas.
Sinto que o mês presente me assassina,
Corro despido atrás de um cristo preso,
Cavalheiro gentil que me abomina
E atrai-me ao despudor da luz esquerda
Ao beco de agonia onde me espreita
A morte espacial que me ilumina.
Sinto que o mês presente me assassina
E o temporal ladrão rouba-me as fêmeas
De apóstolos marujos que me arrastam
Ao longo da corrente onde blasfemas
Gaivotas provam peixes de milagre.
Sinto que o mês presente me assassina,
Há luto nas rosáceas desta aurora,
Há sinos de ironia em cada hora
(Na libra escorpiões pesam-me a sina)

Há panos de imprimir a dura face
À força de suor, de sangue e chaga.
Sinto que o mês presente me assassina,
Os derradeiros astros nascem tortos
E o tempo na verdade tem domínio
Sobre o morto que enterra os próprios mortos
O tempo na verdade tem domínio,
Amém, amém vos digo, tem domínio
E ri do que desfere verbos, dardos
De falso eterno que retornam para
Assassinar-nos num mês assassino.


BALADA

(Em memória de uma poeta suicida)

Não conseguiu firmar o nobre pacto
Entre o cosmos sangrento e a alma pura.
Porém, não se dobrou perante o fato
Da vitória do caos sobre a vontade
Augusta de ordenar a criatura
Ao menos: luz ao sul da tempestade.
Gladiador defunto mais intacto
(Tanta violência, mas tanta ternura),

Jogou-se contra um mar de sofrimentos
Não para pôr-lhes fim, Hamlet, e sim
Para afirma-se além de seus tormentos
De monstros cegos contra só um delfim,
Frágil porém vidente, morto ao som
De vagas de verdade e de loucura.
Bateu-se delicado e fino, com
Tanta violência, mas tanta ternura!
Cruel foi teu triunfo, torpe mar.
Celebrara-te tanto, te adorava
De fundo atroz à superfície, altar
De seus deuses solares - tanto amava
Teu dorso cavalgado de tortura!
Com que fervor enfim te penetrou
No mergulho fatal com que mostrou
Tanta violência, mas tanta ternura!

Envoi

Senhor, que perdão tem o meu amigo
Por tão clara aventura, mas tão dura?
Não está mais comigo. Nem conTigo:
Tanta violência. Mas tanta ternura.

quarta-feira, 23 de maio de 2012

GALERIA: SARA SAUDEK


UM POEMA DE MARCELI ANDRESA BECKER



arquear o corpo da mulher. música xilofonada em ossos: arcadas, fósseis. o sangue apaixonado a se espraiar pelos microcanais das tetas.

cabeça, o lustre absoluto. uma imensa copa cujos galhos se inclinam para o outro lado da noite: ouve-se o silêncio, o tônus secreto das línguas, como que varado por um fogo de patas, que bate casco. queima, fluído.

dizem, é o canto desentranhado, a delicada implosão do músculo da luz; dizem, é o amor, de repente, uma lira quadrúpede que se deixa tanger pelo crime, este crime lentamente masculino.

tudo canta por baixo dos testículos tombados.

terça-feira, 22 de maio de 2012

MOMENTO CRÍTICO


 Críticos da Escola do Ressentimento analisando um texto literário.

GALERIA: AUGUSTO DE CAMPOS


UMA CONVERSA COM AUGUSTO DE CAMPOS


Augusto de Campos é um poeta com vocação para o futuro. Na época do “pós-moderno”, que se traduz no retorno a formas neoclássicas ou numa releitura do Modernismo dos anos 30, ele insiste em “desafinar o coro dos contentes”. À margem da margem, recusa o tom confessional e discursivo e insiste na busca da beleza difícil. Com os novos recursos oferecidos pela informática, Augusto vem realizando experiências com a poesia digital, que une a cor, o som, a palavra e o movimento, retomando o ideário da poesia concreta, com mais vigor e rigor. Tradutor incansável, Augusto publicou uma nova coletânea de poesia russa contemporânea, enfocando nomes da vanguarda do início do século, como Maiakóvski e Khlébnikov. A tradução — ou “recriação” — , como ele prefere chamar, é “uma forma de aprendizado, de crítica criativa e de conversa inteligente”. Com o poeta norte-americano e. e. cummings, por exemplo, ele mantém um diálogo de quase quatro décadas, que vem inseminando a sua própria produção. Para os que pensam que a arte poética está exaurida, o poeta sentencia: “Tudo está dito. Tudo é infinito”.   

Confiram abaixo alguns trechos da entrevista que fiz com o poeta, publicada em 1999 no Suplemento Literário de Minas Gerais.

 A crise do verso anunciada por Mallarmé, a seu ver, aponta para o fim da poesia como arte verbal, com a adoção dos meios eletrônicos, ou ainda é possível a experimentação no poema-texto?

— Não acho que a crise do verso aponte para o fim da poesia como arte verbal, mas para um redimensionamento estrutural do poema. Essa reestruturação começou a ser trabalhada de vários modos pelas vanguardas do início do século, mas foi interrompida pela intervenção de duas grandes guerras e de duas ditaduras, a nazista e a stalinista, que perseguiram tenazmente os artistas experimentais e retardaram a evolução. Retomada, sob a inspiração de Mallarmé, pela poesia concreta, na segunda metade do século, essa abertura estrutural continha em germe os pressupostos das linguagens que iriam encontrar o seu "habitat" natural no contexto das novas tecnologias eletrônicas. Nesse contexto, a palavra não deixa de ter lugar, mas tem que ser reciclada, entrando em contato direto com a dimensão não-verbal, as imagens e os sons, e passa a ser interdisciplinar, intertextual e muitas vezes interativa, além de projetar-se em parâmetros materiais mais amplos, que devem levar em conta critérios de forma, cor, espaço e movimento. Não há porque excluir o livro ou outros suportes matéricos e textuais, que seguem o seu curso e até se beneficiam da tecnologia digital no processo de sua feitura. O que ocorre é a abertura insopitável para o universo virtual, em situações em que a palavra, potencializada em todos os seus parâmetros, já não cabe no livro. Suponho que haverá ainda, por muito tempo, lugar para aqueles que prefiram trabalhar exclusivamente as poéticas do texto fora do contexto das novas mídias eletrônicas. Por outro lado, insisto em sublinhar, o mero domínio do computador não transforma ninguém, só por só, em grande poeta, e as facilidades da engenharia digital devem preocupar sempre aqueles que a usam. Acima de tudo, a grande arte é sempre difícil. "Sem presumir o que sairá daqui, nada ou quase uma arte", dizia Mallarmé, há um século, no prefácio do Lance de dados, que antecipou todos os lances. E Pound, inventor de tudo: "Beauty is difficult". E Schoenberg, mestre de todos, aos seus alunos: "Eu vim aqui para tornar impossível a vocês compor música". Daí surgiram Anton Webern, Alban Berg e John Cage.

Fale um pouco sobre o seu método de trabalho. Costuma escrever todos os dias? Quando escreve um poema, o que surge primeiro: o assunto, alguma palavra, o design ou algum recurso de linguagem? Tudo é planejado, ou em dado momento entra em ação o acaso?

— Trabalho todos os dias, mas poemas, mesmo, faço muito poucos. Traduzo muito mais poemas alheios do que faço os meus próprios. É uma forma de aprendizado, de crítica criativa e de conversa inteligente. Armazeno informações e me preparo, sem pressa. Mas não planejo racionalmente poemas. Uma forma, uma frase, uma imagem, um fato, uma emoção, uma palavra podem constituir um indício e precipitar um momento de tensão, a partir do qual se desencasula o poema, que, então sim, depois da chispa inicial, pode ser controlado, desenvolvido e aperfeiçoado com o know how adquirido. Não desdenho o acaso, ao qual até já dediquei um poema.

Em Música de invenção, você fez uma ampla abordagem da música experimental do século XX. Aliás, sua preocupação nessa área está presente também em obras como O balanço da bossa, as traduções de Arnaut Daniel e do Pierrot Lunaire e as parcerias com Caetano Veloso. Qual é a importância da música para o seu trabalho poético?

— A importância da música é obviamente muito grande em meu trabalho, que começou sob o signo dela. Antes mesmo do lançamento oficial da poesia concreta no Museu de Arte Moderna de São Paulo, em 1956, três poemas do Poetamenos foram apresentados no Teatro de Arena, num espetáculo que já levava o título de Música e Poesia Concreta, ao lado de Machaut e Webern, em 1955. O trabalho com Cid Campos, no CD Poesia é risco e nos espetáculos do mesmo nome testemunham a continuidade da presença da música em minha atuação poética. Assim como o recente Música de invenção, que tenta alertar para a grande lacuna cultural deste fim de século, que é a paradoxal marginalização da música erudita moderna, da "música contemporânea", uma das mais fascinantes aventuras da criação artística do nosso tempo.



Você publicou uma nova edição, ampliada, dos poemas de cummings, autor que vem traduzindo desde os anos 50. A seu ver, a contribuição de cummings já está esgotada, ou ainda é possível aprender algo de novo com ele?

— cummings está mais vivo que nunca. Sua poesia é mais nova e mais atual do que a maior parte da que se lê hoje, considerando-se que houve nos últimos tempos, a pretexto de "pós-moderno" (na verdade, antes "anti" ou "contra"' moderno, quase sempre) um retrocesso na linguagem poética. cummings concilia liberdade (desmembra e intercepta frases, palavras e sílabas, dinamizando o poema e multiplicando as direções e as dimensões da leitura) e rigor (suas estruturas poéticas obdecem a processos de organização que se opõem às facilidades verbais), o que é raro. Há muito que aprender e que degustar em sua poesia.

Qual é a sua opinião sobre dois movimentos estéticos recentes, o Neobarroco e a Language poetry?

— A meu ver, nem o "Neobarroco" nem a "Language poetry" constituem propriamente movimentos. A expressão "neobarroco" caracteriza antes uma interpretação de certos aspectos estilísticos da linguagem literária do nosso tempo, especialmente da América Latina de língua espanhola. Mas, se se quiser, poder-se-á encontrar estilemas barrocos em Joyce e até na poesia concreta. O grupo da "Language poetry" é mais definido, por ter se concentrado fisicamente em torno de uma revista, cujo primeiro número apareceu em 1978, mas não tem a envergadura de um movimento. Chamou a atenção para a materialidade da palavra, no contexto da poesia norte-americana, mas essa preocupação já fora explicitada, com maior nitidez e amplitude, em teoria e prática, pela poesia concreta, desde a década de 50. Acho a maioria dos poetas ligados à revista muito prejudicada pela opacidade da "escrita não-referencial", derivada dos "botões tenros" de Gertrude Stein, e muito ingurgitada de algaravia crítica. Ainda assim, a ênfase na materialidade do texto fez do grupo, no mínimo, um pólo de discussão relevante no âmbito da poesia norte-americana contemporânea.

Tudo está dito? Ou ainda há o que dizer, em poesia?

— Tudo está dito. Tudo é infinito.

segunda-feira, 21 de maio de 2012

sexta-feira, 18 de maio de 2012

O QUE É A POESIA?


A poesia é de longe a linguagem de maior potência de significação – “a mais condensada forma de expressão verbal”, no dizer de Pound –, e não é de espantar a variedade de leituras, de idiossincrasias, de práticas que permeiam a poética contemporânea e, evidente, a sua recepção. Tão diversas como o são os próprios seres e seus interesses.

 O poeta e editor Edson Cruz instigou a possibilidade dessa reflexão e constatação convidando poetas de várias linhagens e calibres a refletirem sobre o fazer poético e as referências fundamentais para o trabalho de cada um deles.

 O resultado transformou-se em livro que será o mote para os diálogos que a Casa das Rosas - Espaço Haroldo de Campos de Poesia e Literatura tem o prazer de oferecer (todo o último domingo do mês) a partir de maio.

 A cada encontro, um grande poeta em atividade falará sobre sua visão de poesia, sobre suas influências, sobre a recepção de seu trabalho e o mercado editorial, além de responder a questões do mediador e do público presente.

PROGRAMAÇÃO

 Dia 27/05, domingo, das 16h às 18h:
AUGUSTO DE CAMPOS

Augusto de Campos nasceu em 1931. É poeta, advogado, tradutor, crítico e publicitário. Estreou em fevereiro de 1949 na Revista de Novíssimos e logo depois publica nas páginas da Revista Brasileira de Poesia, ligada ao clube de Poesia de São Paulo, da geração de 1945. Em 1951 edita por conta própria o livro O Rei Menos o Reino. No ano seguinte funda o Grupo Noigandres, com seu irmão Haroldo e o poeta Décio Pignatari . Participando do lançamento da revista Noigandres, publica no primeiro número os poemas “Ad Augustum per augusta” e o “Sol por natural”. Iniciou em 1953 a série “Poetamenos”, que seria publicada em 1955, no n.2 da revista Noigandres. Começa a publicar seus primeiros artigos teóricos em 1955, já em outubro cunhava para a nova poesia que surgia o termo poesia concreta. Em novembro vê seu “Poetamenos” ser oralizado pelo grupo Ars Nova, ao mesmo tempo que realizou conferência sobre as correspondências estéticas entre as novas artes que surgiam. Em 1956 inicia correspondência com e.e.cummings. Finaliza com Haroldo de Campos a tradução de 17 cantares de Pound e entrega para publicação 10 poemas de e.e.cummings. No final do ano ajuda a organizar a I Exposição Nacional de Arte Concreta, em São Paulo e em fevereiro do ano seguinte no Rio. Publica Noigandres n.3. Em 57 lança, como articulista do Suplemento Dominical do Jornal do Brasil, textos que seriam base do Plano Piloto para Poesia Concreta, lançado pelo grupo em 1958. Publica nesse ano Noigandres n.4. Em 1959 entra em contato com a poesia de Sousândrade, Em 1906 participa da realização da página Invenção no Correio Paulistano. Publica a tradução de cummings e de Ezra Pound. Publica em invenção estudos sobre Sousândrade. Nos anos 60 transfere sua atenção para a cultura de massa, em especial a música popular, publicando o Balanço da Bossa, em 1968. Em 1995 lançou com seu filho, o músico Cid Campos, o CD “poesia é risco” (Polygram). A performance criada a partir do CD, em parceria com Walter Silveira, já foi apresentada em diversos eventos, no Brasil e no Exterior. Nos últimos anos, Augusto de Campos vem se dedicando à feitura de poemas “verbovocovisuais” em mídia digital. Trabalhando com um computador Macintosh e programas de multimídia, desenvolve poemas novos, bem como releituras de obras anteriores, com recursos de som, animação e interatividade. Em 1996, participa da exposição Utopia como poeta do mês. Atualmente desenvolve um trabalho de poesia utilizando-se da linguagem do computador, exibindo-os via internet. Vive e trabalha em São Paulo.

Dia 24/06, domingo, das 16h às 18h

RICARDO CORONA  

Ricardo Corona atua nos seguintes campos: poesia contemporânea brasileira e hispano-americana, estudos de relação entre as áreas artísticas (performance, poesia sonora, artes visuais), tradução, linguagem e cultura. É autor dos livros ¿Ahn? (Madri, Poetas de Cabra, 2012), Ahn? (Jaraguá do Sul, Editora da Casa, 2012), Curare (Iluminuras, 2011 – Premio Petrobras), Amphibia (Portugal, Cosmorama, 2009), Corpo sutil (2005), Tortografia, com Eliana Borges (2003) e Cinemaginário (1999), publicados pela Editora Iluminuras. Na área de poesia sonora, gravou o CD Ladrão de fogo (2001, Medusa) e o livro-disco Sonorizador (Iluminuras, 2007). Organizou a antologia bilíngue (português-inglês) de poesia Outras praias / Other Shores (Iluminuras, 1997). Com Joca Wolff, traduziu o livro-dobrável aA Momento de simetria (Medusa, 2005) e a coletânea Máscara âmbar (Lumme, 2008), de Arturo Carrera (com posfácio de Raúl Antelo) e, esparsamente, publicou traduções de Henry Michaux, Gary Snyder e William Carlos Williams. Com Mario Cámara, Daniel Link, Reinaldo Laddaga, Romina Freschi, Nora Domínguez, entre outros estudiosos da literatura hispano-americana, participa do livro La poesía de Arturo Carrera – Antología de la obra y la crítica, organizado por Nancy Fernández e Juan Duchesne Winter (Instituto Internacional de Literatura Iberoamericana/Universidade de Pittsburgh, 2010). Tem ensaios e poemas publicados nas revistas Poiésis (Brasil), Tsé-tsé (Argentina), Rattapallax (USA), Caligramme (França), Separata (México) e nos jornais Suplemento Literário de Minas Gerais (Brasil) e caderno Mais! (Folha de S. Paulo). Com Eliana Borges criou as revistas de poesia e arte Medusa (1998-2000) e Oroboro (2004-2006) e com Joana Corona o jornal Vagau (2011). Desde 1996, apresenta trabalhos performativos que envolvem música eletroacústica, artes visuais e poesia sonora, dos quais, destacam-se Carretel curare (2011) e as parcerias com Eliana Borges, Tsantsa (2011), Alfabeto móvel (2010), Nomos (2009), Tambaka (2008) e Jolifanto (2007).

Dia 29/07, domingo, das 16h às 18h

AFFONSO ROMANO DE SANT’ANNA

 Affonso Romano de Sant’Anna: Um dia dizendo seus poemas no Festival Internacional de Poesia Pela Paz, na Coréia (2005), ou fazendo uma série de leituras de poemas no Chile, por ocasião do centenário de Neruda ( 2004), ou na Irlanda, no Festival Gerald Hopkins(1996), ou na Casa de Bertold Brecht, em Berlim(1994), outro dia no Encontro de Poetas de Língua Latina(1987), no México, ou presente num encontro de escritores latino-americanos em Israel(1986), ou participando o International Writing Program, em Iowa(1968), Affonso Romano de Sant’Anna tem reunido através de sua vida e obra, a ação à palavra . Nos anos 90 foi escolhido pela revista “Imprensa” um dos dez jornalistas que mais influenciam a opinião pública. Em 1973 organizou na PUC/RJ a EXPOESIA, que congregou 600 poetas desafiando a ditadura e abrindo espaço para a poesia marginal; foi assim quando em 1963, no início  de sua vida literária, tornou-se um dos organizadores da Semana Nacional de Poesia de Vanguarda, em Belo Horizonte. Com esse mesmo espírito de aglutinar e promover seus pares criou, em1991, a revista “Poesia Sempre” que divulgou nossa poesia no exterior e foi lançada tanto na Dinamarca, quanto em Paris, tanto em São Francisco quanto New York, incluindo também as principais capitais latino-americanas. Atento à inserção da poesia no cotidiano, produz poemas para rádio, televisão e jornais. Tendo vários poemas musicados (Fagner, Martinho da Vila), foi por essa e outras razões convidado a desfilar na Comissão de Frente da Mangueira na homenagem a Carlos Drummond de Andrade, em 1987.  Apresentou-se falando seus poemas, em concerto, ao lado do violonista Turíbio Santos. Tem também quatro CDs de poemas: um gravado por Tônia Carrero, outro comparticipação especial de Paulo Autran, outro na sua voz editado pelo Instituto Moreira Salles e o mais recente outro pela Luzdacidade, com a participação de atrizes e escritoras. Seu CD de crônicas, tem participação especial de Paulo Autran. Escreveu dezenas de livros de ensaios e crônicas. Como cronista, aliás, substituiu Carlos Drummond de Andrade no “Jornal do Brasil” (1984).


Curador e Mediador: EDSON CRUZ (Ilhéus, BA), poeta e editor do site de Literatura e Adjacências MUSA RARA (www.musarara.com.br). 

 Casa das Rosas Espaço Haroldo de Campos de Poesia e Literatura
Av. Paulista, 37 - Bela Vista
CEP.: 01311-902 - São Paulo - Brasil
(11) 3285.6986 / 3288.9447
contato.cr@poiesis.org.br

quinta-feira, 17 de maio de 2012

POESIA DOS 4 CANTOS: NOITE PALESTINA



Caros, amanhã, sexta-feira, às 20h30, acontecerá o evento POESIA DOS 4 CANTOS: NOITE PALESTINA, na Praça Mário Chamie (Bibliotecas) do Centro Cultural São Paulo, com a poeta Francesca Cricelli, os músicos Claudio Rogério de Queiroz, William Bordokan, Semi el Khouri Bordokan e a dançarina Cristina Antoniadis Bordokan. Entrada franca - sem necessidade de inscrição, nem retirada de ingressos.

Centro Cultural São Paulo

Rua Vergueiro, n. 1.000, próximo à estação do metrô.

GALERIA: JORGE LUIS BORGES


UM POEMA DE JORGE LUIS BORGES


           
História da Noite

Ao longo de gerações
os homens erigiram a noite.
No princípio era cegueira e sonho
e espinhos que laceram o pé desnudo
e temor dos lobos.
Nunca saberemos quem forjou a palavra
para o intervalo de sombra
que divide os dois crepúsculos;
nunca saberemos em que século foi cifra
do espaço de estrelas.
Outros engendraram o mito.
A fizeram mãe das Parcas tranquilas
que tecem o destino
e lhe sacrificaram ovelhas negras
e o galo que profetiza seu fim.
Doze casas lhe deram os caldeus;
infinitos mundos, o Pórtico.
Hexâmetros latinos a modelaram
e o terror de Pascal.
Luis de Leon nela viu a pátria
de sua alma estremecida.
Agora a sentimos inesgotável
como um vinho antigo
e ninguém pode contemplá-la sem vertigem
e o tempo a carregou de eternidade.

E pensar que não existiria
sem esses tênues instrumentos, os olhos.

Tradução: Claudio Daniel

quarta-feira, 16 de maio de 2012

AGORA É QUANDOS




“Para ser poeta é preciso ser mais do que poeta”, escreveu Paulo Leminski. É preciso ter os ouvidos de um músico de jazz, os olhos de um pintor cubista, o olfato de um chef de culinária tailandesa, o tato de um cirurgião ou de um amante, que saiba explorar cada partícula de pele. A poesia talvez seja a arte da síntese, que assimila os recursos das outras artes, sem perder a sua especificidade, a luxúria da palavra. Tambores pra N’zinga, livro de estréia de Nina Rizzi (Rio de Janeiro: Editora Multifoco, 2012), traz a música já no título da obra, anunciando a sonoridade de versos que exploram a coloquialidade, a delicadeza, o humor, em peças ora fragmentárias, elípticas, ora tecidas em fluente discursividade, herdeira do verso livre modernista.

A imagem se faz presente nessas linhas com a força de sua materialidade, como na composição em cinza e verde: “cobri o rosto em aço e folhas / que engraçado: / borboleta, cadela, estrela, nunca mais / -- isso aqui é um maciço, mínimo”.   Em outra peça, intitulada pra o fim da melodia, orquestras reais, a autora diz: “lilás são os meus dentes e lábios e pernas e unhas. / minados, olhos / o meu exército, william, é de violetas”. A objetividade das coisas torna-se com frequência um recurso para a ironia ou o paradoxo, figuras caras à autora, como no poema outra cantata pra depois do nunca mais: “como poderia esquecer? / caixa de ressonância acústica, vibro: / suas palavras andam de bicicleta por meus ecos e umbigo”.

Nina Rizzi, feiticeira de vocábulos, faz da ironia lacônica a sua pedra-de-raio, o seu talismã, e apresenta ao leitor pequenos relâmpagos como estes: “já volto, vou me inexistir / no peito, aquela coisa de moer cana” (bachiana em dois movimentos para villa-lobos) ou ainda “adoro quando ela, afogada, acorda pra me ler” (pedrita numa nota). A veia erótica comparece do início ao fim do livro, ora com a sutileza do noturno: “depois, como não findasse o cio, / dava pena sentir tanto amor”, ora com a virulência do noturno da rua da glória: “há centenas de esquinas esperando / prontas pra ouvir – te amo. / mas ele, não mais, nunca mais / me diz – puta.”

Haveria muito mais o que dizer do livro de Nina Rizzi, sua dimensão política, a relação com o profano e o sagrado, a construção do tempo e da memória, mas deixarei aqui apenas essas pistas de leitura para o leitor interessado. Esta poeta, que também trabalha com o desenho, a pintura, a música, a videopoesia, surpreende como a onça de Guimarães Rosa, que não é uma, mas muitas. Vamos ouvir os toques do tambor!

terça-feira, 15 de maio de 2012

NAKBA: A TRAGÉDIA DE UM POVO

 
Nakba é uma palavra árabe que significa "catástrofe" e designa o êxodo palestino de 1948, quando soldados sionistas do recém-fundado Estado de Israel destruíram mais de 500 aldeias palestinas, como as de Deir Yassin e Khan Yunis, massacrando milhares de civis e levando ao êxodo cerca de 750 mil palestinos, que se refugiaram em países árabes vizinhos. Hoje, cerca de 4,5 milhões de palestinos vivem em acampamentos de refugiados na Síria, no Líbano e em outros países, proibidos de voltar a suas casas e terras pelo regime sionista. 15 de maio, dia de solidariedade ao povo palestino!

domingo, 13 de maio de 2012

GALERIA: DEIR YASSIN


1948: MASSACRE DE DEIR YASSIN


Peter Phillipp

Na madrugada de 9 de abril de 1948, 120 terroristas invadiram e ocuparam o povoado de Deir Yassin, a oeste de Jerusalém. Testemunhas oculares relataram que eles foram de casa em casa e abriram fogo contra seus moradores. 

Quem visita Israel precisa procurar muito para encontrar vestígios de antigos povoados árabes. Em geral, tratam-se de ruínas. Na guerra de 1948, 400 povoados palestinos foram destruídos e seus moradores expulsos. Lugarejos que existem apenas em mapas antigos. 

Cerca de 700 mil palestinos foram expulsos de suas casas, algo atualmente reconhecido por historiadores israelenses como um processo sistemático de banimento ou deportação. 
 
Fim do sonho de dois Estados 

Em 29 de novembro de 1947, as Nações Unidas haviam decidido criar um Estado palestino e um israelense, sendo que Jerusalém seria internacionalizada. O Reino Unido anunciou a disposição de desistir de seu mandato sobre a Palestina. Mas o mundo árabe rejeitou a divisão. Também círculos nacionalistas radicais judeus não concordavam, por temer o avanço árabe. 

À medida que se aproximava a data da retirada definitiva dos britânicos da Palestina, em 15 de maio de 1948, a situação ficou cada vez mais tensa e as manifestações se ampliaram, muitas vezes seguidas de conflitos armados. 

Dois grupos judeus clandestinos arquitetaram um plano. O "Irgun", do posterior primeiro-ministro Menachem Begin, e o "Lehi": expulsar os palestinos que morassem no futuro território israelense. 

O primeiro povoado escolhido foi Deir Yassin, invadido por 120 terroristas na madrugada de 9 de abril de 1948. Testemunhas oculares relatam que eles dispararam as armas imediatamente. 

Às 11 horas da manhã, o lugarejo estava tomado. Os terroristas começaram a ir de casa em casa para assassinar seus moradores, fossem crianças, mulheres ou idosos. A maioria dos homens a esta altura já tinha fugido. 

Somente à tarde, quando os moradores judeus ortodoxos começaram a retornar do trabalho e a contar que os demais habitantes sempre foram pacíficos, o massacre teve fim, 250 sobreviventes foram transportados de caminhão e descarregados no lado árabe de Jerusalém.

Deir Yassin simplesmente deixou de existir. Embora as lideranças do movimento clandestino judeu "Hagana" tenham condenado o massacre, nada aconteceu com os responsáveis. 

(Confiram mais artigos sobre a questão palestina no link Opinião da revista Zunái, na página http://www.revistazunai.com/editorial/index.htm)

sábado, 12 de maio de 2012

DOIS DEDOS DE PROSA: EVANDRO AFFONSO FERREIRA



 O escritor Evandro Affonso Ferreira fará um depoimento sobre a sua carreira literária e conversará com o público sobre temas como a construção do romance, o papel da crítica literária, a função da literatura na época contemporânea, entre outras questões, na edição de maio do ciclo DOIS DEDOS DE PROSA, do Centro Cultural São Paulo, que acontecerá na próxima terça-feira, dia 15, às 19h, na Sala de Debates. Entrada franca - sem necessidade de inscrição, nem retirada de ingressos.

MALLARMARGENS: NOVA REVISTA DE POESIA

 
Caros, confiram uma nova revista eletrônica de poesia, criada por um grupo de poetas jovens: MALLARMAGENS. O projeto visual é belíssimo e a seleção de textos, bastante criteriosa. Entre os autores que colaboram na publicação destacam-se Andréia Carvalho, Daniel Faria, Nuno Rau, Roberta Tostes Daniel, Marceli Andresa Becker e Jacineide Travassos. O endereço da página é http://mallarmargens.blogspot.com.br

quinta-feira, 10 de maio de 2012

GALERIA: VICENTE HUIDOBRO


TREMOR DE CÉU (fragmentos)



     Vestida de branco, Isolda vinha como uma nuvem.
     Então a lua começou a cair envolta em chamas. E nas praias dançava um reflexo de fogo.
    Os espectros saem um a um de cada onda que se levanta. Vocês que estão aí escondidos, chegou a hora de tremer ante a voracidade da morte.
    O sol poente faz uma auréola sobre a cabeça do último náufrago que flutua à deriva sem ouvir mais os cantos da margem.
    Os lobos passeiam com os olhos brilhantes entre os ramos da noite, enlaçados estreitamente e chorando sem causa precisa.
    O homem aquele, maior que os outros, abre a boca no meio do jardim e começa a tragar vagalumes durante horas inteiras.
    As árvores estão retorcidas por causa de uma dor estranha. E uma quantidade de meteoros que caem do céu formam espirais em nossa atmosfera como se fossem pedras na água.
    O fumo espesso sai de todos os lados. Agora só brilham os olhos dos lobos e o homem cheio de vagalumes.
     Todo o resto é penumbra.
    A montanha abre suas portas e o cego entra com os braços estendidos.
    Há uma árvore, uma grossa árvore que se retorce no fogo do crepúsculo.
    Acima, Deus está embalando um planeta recém-nascido.
      Caem estrelas sobre a terra. Uma após outra vão caindo centenas de auréolas sobre a terra, algumas sobre certas cabeças...E nada mais?
    Uma ilha de palmeiras surge do mar para os noivos que passeiam enlaçados.
    Algum dia um deles encontrará a cabeça que havia perdido, imóvel no mesmo lugar em que a perdera.
    Quando? Onde? Qual deles?


                                       (. . .)


    Todas essas mulheres são árvores ou pedras de repouso no caminho, talvez desnecessárias.
    Garrafas de água ou tonéis de embriaguês geralmente sem luz própria. Obedecem como as catedrais a um princípio musical. Cada acorde tem seu correspondente e tudo consiste em saber tocar o ponto do eco que há de responder. É fácil fazer tecidos de sons e construir um verdadeiro teto ou magníficas cúpulas para os dias de chuva.
    Se o destino permite, podemos abrigarnos por um tempo e contar os dedos daquela que nos estende os braços.
    Logo o fantasma nos obrigará a seguir a marcha. Saltaremos por cima dos seios palpitantes que são suas cúpulas porque ela estendida de costas imita um templo. Melhor dizendo, são os templos que imitam a elas, com suas torres como seios, sua cúpula central como cabeça e sua porta como querendo imitar o sexo por onde se entra em busca da vida que pulsa no ventre e por onde deve sair depois a mesma vida.
    Porém, nós não temos de aceitar semelhante imitação nem podemos crer em tal vida. Nesta vida que sai com os olhos vendados e vai estrelando-se em todas as árvores da paisagem. Só acreditaremos nas flores que são berços de gigantes, embora saibamos que dentro de cada casulo dorme um duende.

Vicente Huidobro

Tradução: Claudio Daniel 


terça-feira, 8 de maio de 2012

GALERIA: NINA RIZZI


POEMAS DE NINA RIZZI


CECILIANA

escorre o óleo do mundo – lima
de rícino, refino

mínima grama ou toda
canteiro, fecundo

a poesia é de quem
precisa, disse o carteiro

lhe ria, além a lama
ternas de exílio e poda

te revisito, o mundo – olha
entre as pernas


BACHIANA EM DOIS MOVIMENTOS PRA VILLA-LOBOS

já volto, vou me inexistir

no peito, aquela coisa de moer cana.


PEDRITA NUMA NOTA

adoro quando ela, afogada, acorda pra me ler


OUTRA CANTATA PRA DEPOIS DO NUNCA MAIS

como poderia esquecer?

caixa de ressonância acústica, vibro:
suas palavras andam de bicicleta por meus ecos e umbigo.

(Do livro Tambores pra n’zinga. Rio de Janeiro: Editora Multifoco, Selo Orpheu, 2012)

GALERIA: ADEMIR ASSUNÇÃO


UM POEMA DE ADEMIR ASSUNÇÃO

 

CAVALO


eu não sei qual Iansã
qual Oxalá qual Oxalufã qual Iemanjá
me manda mensagens no meio da noite
garrafas quebradas, retalhos de naufrágios
miragens escuras das profundezas do mar

não sei por que me escolheram cavalo
dessas musas tumultuosas

só cumpro minha sina
em São Paulo, Paris ou na Abissínia
erigindo pirâmides com câmaras cavernosas
que mais noite ou menos dia
vão se espalhar pelos quatro ventos
da Via Láctea em combustão
numa vertigem de bruma e poeira de estrelas

e depois disso só restará o amor
luzindo na pele de uma mulher
que ainda se lembrará de mim
antes do instante do sim

(Poema do livro A Voz do Ventríloquo. São Paulo: editora Edith, 2012)

segunda-feira, 7 de maio de 2012

POETAS DE CABECEIRA: CRUZ E SOUSA



Caros, amanhã, terça-feira, às 19h30, Danilo Bueno apresentará uma palestra sobre Cruz e Sousa, na Sala de Debates do Centro Cultural São Paulo. O evento integra a programação do ciclo mensal Poetas de Cabeceira. Entrada Franca, sem necessidade de retirada de ingressos.

Centro Cultural São Paulo

Rua Vergueiro, 1.000 (próximo à estação do metrô)

sábado, 5 de maio de 2012

GALERIA: JOSÉ KOZER


DIEZ PAUTAS DE JOSÉ KOZER


1. Leer toneladas de libros, leer a todos los poetas de todos los tiempos y culturas, de modo asistemático y a mansalva. Leer estimula escritura.

2. Buscar modelos –sobran- de mala poesía para estudiarlos. Los ejemplos –no sobran- de buena poesía no se prestan al aprendizaje, se acercan demasiado a lo perfecto, donde no vemos nada.

3. El poema, incluso el poema roto (desprendido) (desencajado) (lo cual no implica desaliño) debe atar todos sus elementos en una forja ulterior.

4. O se organiza la propia existencia alrededor de la escritura o no se escribe.

5. El poeta debe salir a aprender de los músicos, pintores, arquitectos, pero no de otros escritores, y mucho menos de otros poetas. Un poeta vivo no tiene nada que enseñarnos, si somos poetas: por el contrario, de un pintor o de un compositor podemos aprender.

6. Lo único que la Naturaleza puede enseñar son palabras.

7. Las ciencias disciplinan, me ofrecen un lenguaje concreto, especializado, no me son útiles en cuanto materia poética sino para reconocer estructuras vivas y revitalizadoras. Las estructuras llevan a una mejor escritura, cuando se aproximan inconscientemente al misterio de la creación. Los oficios, a diferencia de los científicos, lo entregan todo: léxico, formas, quehacer, manejo del tiempo, precisión, laboriosidad, imágenes, continuidad.

8. El poema se escribe desde unos movimientos telegráficos, caligráficos, mediante brochazos y pinceladas rápidas, afines a lo que el inconsciente exuda: la ortodoxia y la simetría pueden acompañar, pero la irregularidad es mejor compañera. Escribir desde un impulso original, plegándonos a la fuerza (no el esfuerzo) de los sentimientos. Saber dónde terminar un poema (es algo instintivo) dónde soltar la pluma, retirarse de golpe, dejar de teclear, y hasta mañana. Mañana, en frío, corregir el trabajo del día anterior (Hemingway, en su mejor época, escribe seis horas al día y al día siguiente se queda como mucho con una sola página, a veces con un breve párrafo). Aspirar; expirar: escribir de sopetón; lenta corrección.

9. Hay leyes para la escritura que existen fuera del escritor. Y hay leyes por igual necesarias que existen con exclusividad para el individuo.

10. No evocar, escribir. No pensar, escribir. No mirar, escribir. Tener fe en el arranque, en la imagen o palabras recibidas. Reconocer el primer impulso, anotarlo, dejarse llevar: el poema corre por su cuenta, sólo hay que ayudarlo a parir.

GALERIA: JUAN CARLOS ONETTI (II)


sexta-feira, 4 de maio de 2012

UM POEMA DE JUAN CARLOS ONETTI


BALADA DO AUSENTE

Então não me dê um motivo, por favor,
Não dê consciência à nostalgia,
Ao desespero e ao jogo.
Pensar-te e não ver-te
Sofrer em ti e não alçar meu grito
Ruminar sozinho, graças a ti, por minha culpa,
No único que pode ser
Inteiramente pensado
Chamar sem voz porque Deus quis
Que se Ele tem compromissos
Se Deus mesmo te impede contestar
Com dois dedos a saudação
Cotidiano, noturno, inevitável
É necessário aceitar a solidão,
Confortar-se irmandado
Com o cheiro de cachorro, nesses dias úmidos de sul
Em qualquer regresso
Em qualquer hora mutável do crepúsculo
Teu silêncio
E o passo indiferente de Deus que não vê nem saúda
Que não responde ao chapéu de luto
Golpeando os joelhos
Que teme a Deus e se preocupa
Pelo que opina, condena, resmunga, impõe
Não me dê consciência, grito, necessidade, nem ordem.
Estou nu e longe, o que me deixaram
Girou para o mundo e seu segredo de musgo,
Até a claridade dolorosa do mundo,
Nu, sozinho, desarmado, rolou meu corpo magro
Tropeço e avanço
Aproximo-me talvez de uma fronteira
A um ódio inútil, à sua crescente miséria
E tampouco é consolo
Essa doce ilusão de paz e de combate
Porque a distância
Não é já, se dissolve na espera
Graciosa, incompreensível, de ajudar-me
A viver e esperar.
Nenhum outro país é para sempre
Meu pé esquerdo na barra de bronze
Fundido com ela.
O moço que compreende, ajuda a esperar, acredita que pode ignorar.
Aceitam-se todas as apostas:
Eternidade, inferno, aventura, estupidez
Mas sou maior
Já nem sequer creio
Em romper espelhos
Na noite
E lamber o sangue dos dedos
Como se tivesse traído desde lá
Como se a salobra mentira se engrossasse
Como se o sangue, pequena dor afiada,
Aproximasse-me ao que resta vivo, brando e ágil.
Morto pela distância e o tempo
E eu a perco, dou minha vida,
Mudo de velhices e ambições alheias
Cada dia mais antigas, vilmente desejosas e estranhas.
Voltei e não voltarei, não posso cair.
Apoiarei o sapato na viga de bronze
E espero sem pressa sua velhice, sua singularidade, seu minúsculo não ser.
A paz e depois, afortunadamente, em seguida, nada.
Lá estarei. O tempo não tocará meu pelo, não inventará rugas, não me inchará as bochechas
Aí estarei esperando uma nomeação, um encontro
Que não se cumprirá.

Tradução: Nina Rizzi. 


quinta-feira, 3 de maio de 2012

GALERIA: JUAN CARLOS ONETTI (I)


EM BUSCA DAS CIDADES IMAGINÁRIAS


O escritor argentino Jorge Luiz Borges imaginou uma cidade labiríntica construída no deserto africano, habitada por imortais reduzidos à condição de trogloditas que se alimentavam de carne de serpente. Marco Flamínio Rufo, tribuno romano e narrador da história, conta a sua convivência com essa estranha tribo e a amizade que travou com um de seus integrantes, o poeta grego Homero, condenado à imortalidade e a uma existência quase animalesca após beber das águas de um misterioso rio guardado pelas muralhas da cidade sem nome. Borges descreve a arquitetura do lugar de modo sucinto, mencionando pirâmides, praças, templos e torres, detendo-se mais na descrição do labirinto: “Havia nove portas naquele porão e oito davam para um labirinto que falazmente desembocava na mesma câmara; a nona (através de outro labirinto) dava para uma segunda câmara circular igual à primeira. Ignoro o número total de câmaras; minha desventura e minha ansiedade as multiplicaram”. Nessa cidade de pedra, que parecia “anterior aos homens, anterior à terra” e construída por deuses “que estavam loucos” não havia qualquer atividade econômica ou política e os homens, convertidos em feras, desprovidos de linguagem e da noção de tempo, dedicavam-se à mera sobrevivência. Este conto, O Imortal, foi incluído no livro O Aleph, publicado em 1949, e pode ser lido como uma fábula moral e metafísica que mistura erudição e ironia para abordar a solidão humana, a necessidade da morte e do esquecimento.

A ficção de Borges (que inclui outros relatos de cidades e mundos inventados, como Tlon, Uqbar, Urbius Tertius) é um dos marcos dessa tradição da literatura moderna latino-americana: a criação de cidades imaginárias, que são alegorias da angústia e do absurdo da condição humana. Cem Anos de Solidão (1967), romance do colombiano Gabriel Garcia Marquez que narra a saga do coronel Aureliano Buendía na mítica cidade de Macondo, é com certeza a obra mais conhecida desse gênero, que teve como remotos precursores a Odisseia de Homero e As viagens de Gulliver, de Jonathan Swift.
 
Uma obra notável é Pedro Páramo (1955), do mexicano Juan Rulfo, cuja ação se passa na cidade abandonada de Comala, um povoado rural situado próximo às montanhas; lendo esse romance inusitado, ficamos sabendo que possui um rio, uma igreja, uma área urbananizada em que ficam as casas e nada mais. O autor faz pouquíssimas alusões a cenários e ambientes neste romance que é uma sucessão de monólogos e diálogos em que personagens mortos narram, sem uma ordem cronológica linear, diferentes episódios da vida de Pedro Páramo, cujo falecimento antecipa a extinção da própria cidade.  O uruguaio Juan Carlos Onetti, por sua vez, é mais generoso na descrição de Santa Maria, cidade portuária que aparece em vários de seus contos e romances, como A Vida Breve (1950). Lendo este livro fascinante, encontramos referências ao estaleiro, ao mercado, ao cemitério, a um hotel, bares, restaurantes, praças e prostíbulos por onde circula Juan María Brausen, personagem atormentado pela monotonia, angústia e degradação da vida cotidiana. A cidade mitológica criada por Onetti, não menos terrível e perturbadora que a Comala de Rulfo, desperta a curiosidade de seus leitores, que  podem se perguntar: como o escritor concebeu essa cidade? Ele desenvolveu um plano prévio, antes de começar a escrever? Respondendo a uma entrevista para a Revista Bula, pouco antes de seu falecimento, em 1994, o escritor uruguaio declarou: “Uma vez fiz um plano de Santa Maria com um amigo, mas era só para movimentar melhor os personagens. Eu o perdi quando me mudei de Buenos Aires. A mim, se me ocorre escrever um livro, já tem seu lugar em Santa Maria. Porém, nunca me propus desenvolver um plano. Ou seja: nunca quis escrever uma saga. Esse é já um propósito, e eu não poderia escrever com propósitos”.

O escritor mexicano David Toscana, que publicou em 1998 o romance Santa Maria do Circo (cujo título é uma referência paródica à cidade mítica de Onetti), adotou uma outra estratégia criativa: “Imaginei o mínimo que uma cidade possa ter no México: praça, igreja e algumas poucas casas. A imaginação me sugeriu depois que na praça devia existir a estátua de um herói desconhecido. Perguntei a mim mesmo se queria algum outro edifício como escola, hospital, algum comércio ou fábrica, e disse que não. Preferi manter tudo o mais simples possível. No primeiro romance ocupei-me de uma cidade que no final ficou abandonada; agora quis o processo inverso: uma cidade abandonada é povoada”, declarou a mim numa entrevista realizada por e-mail.  O romance conta a história de um grupo de artistas circenses que, ao chegar numa cidade deserta, similar à Comala de Rulfo, decide permanecer ali e fundar uma nova comunidade, batizada de Santa Maria do Circo. A troupe é composta por figuras bizarras como Barbarela, a mulher barbada; Natanael, o anão; Hércules, o homem forte; Mandrake, o mágico; Fléxor, o contorcionista, e Balo, o homem-bala, que decidem escolher novos ofícios, mais úteis à construção do novo mundo. Sendo assim, cada membro do grupo escreve em pedaços de papel as ocupações que julga essenciais, que depois são misturados na cartola do mágico e sorteados ao acaso. Barbarela torna-se médica;  Balo, general; Natanael, padre, e Hércules, prostituta. O bizarro dessa cena é relativizado pelo escritor, para quem o acaso “é o que define quase todas as vidas. São muito poucos os que decidem. Abrir um papelote do chapéu de um mágico e abrir as páginas do jornal para buscar trabalho são coisas muito parecidas. (...) O acaso faz com que um taxista dirija um táxi, posto que quando criança não dizia ‘Quando crescer quero ser taxista’. E no final a vida se parece un pouco com o circo. Pensemos por exemplo na política; aí temos palhaços, prestidigitadores, mágicos, cães dançarinos, equilibristas, domadores, malabaristas e um enorme público que paga muito caro pelo bilhete, ainda que o espetáculo seja péssimo”.

O fracasso da nova sociedade é inevitável, pela escassez de recursos do povoado, e após inúmeras peripécias, similares a farsas circenses, os artistas resolvem abandonar o povoado, acompanhando a caravana de outra companhia circense que passava pelo local. O dono do circo, Don Estevão, porém, recusa-se a levar o anão, a mulher barbada e o homem forte, que são abandonados à própria sorte. Santa Maria do Circo, assim como as cidades míticas criadas por Borges, Onetti e Rulfo, pode ser entendida como uma vasta alegoria da solidão, do fracasso e do absurdo que regem as sociedades latino-americanas.