LILITCHKA!
EM LUGAR DE UMA CARTA
Fumo de tabaco rói o ar.
O quarto –
um capítulo do inferno de Krutchônikh.
Recorda –
atrás desta janela
pela primeira vez
apertei tuas mãos, atônito.
Hoje te sentas,
no coração – aço.
Um dia mais
e me expulsarás,
talvez, com zanga.
No teu “hall” escuro longamente o braço,
trêmulo, se recusa a entrar na manga.
Sairei correndo,
Lançarei meu corpo à rua.
Transtornado,
tornado
louco pelo desespero.
Não o consintas,
meu amor,
meu bem,
digamos até logo agora.
De qualquer forma
O meu amor – duro fardo por certo –
pesará sobre ti
onde quer que ti encontres.
Deixa que o fel da mágoa ressentida
Num último grito estronde.
Quando um boi está morto de trabalho
ele se vai
e se deita na água fria.
Afora o teu amor
para mim
não há mar,
e a dor do teu amor nem a lágrima alivia.
Quando o elefante cansado quer repouso
Ele jaz como um rei na areia ardente.
Afora o teu amor
Para mim
Não há sol,
E eu não sei onde estás e com quem.
Se ela assim torturasse um poeta,
ele
trocaria sua amada por dinheiro e glória,
mas a mim
nenhum som me importa
afora o som do teu nome que eu adoro.
E não me lançarei no abismo,
e não beberei veneno,
e não poderei apertar na têmpora o gatilho.
Afora
o teu olhar
nenhuma lâmina me atrai com o seu brilho.
Amanhã esquecerás
que eu te pus num pedestal,
que incendiei de amor uma alma livre,
e os dias vãos – rodopiante carnaval –
dispersarão as folhas dos meus livros...
Acaso as folhas secas destes versos
far-te-ão parar,
respiração opressa?
Deixa-me ao menos
arrelvar numa última carícia
teu passo que se apressa.
26 de maio de 1916. Petrogrado.
Tradução: Augusto de Campos
quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010
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Claudio, lindo o poema...
ResponderExcluir"E não me lançarei no abismo,
e não beberei veneno,
e não poderei apertar na têmpora o gatilho.
Afora
o teu olhar
nenhuma lâmina me atrai com o seu brilho".
Falar com a boca inflamada, cheia de alguém! Lindo. Belo post.
Marceli, sim, Maiakovski era obcecado por Lília Brick... pela poesia e pela revolução... mas ela preferiu ficar com o marido... a censura stalinista impôs o modelo do "realismo socialista" e a revolução dançou, após Stalin subir ao poder... o poeta perdeu as três coisas que amava, e deu um tiro no peito. Não o censuro. Ah braços,
ResponderExcluirCD
... é triste pensar que o mesmo stalinismo que matou Maiakovski continua vivo em muitos cursos de literatura nas universidades brasileiras... ainda há viúvas de Stalin escrevendo sobre o "compromisso social" de Ferreira Gullar e bobagens sociologóides do gênero... ainda estamos longe de uma glasnost por aqui... felizmente, essas múmias não chegaram ao poder, ou teríamos um gulag para poetas "formalistas" na Floresta Amazônica...
ResponderExcluirLindo poema!
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