segunda-feira, 16 de agosto de 2010

UM POEMA DE JORGE LÚCIO DE CAMPOS

A AULA DE GUITARRA

a Balthus

1
Não me lanço
à vida
por acaso:
não existo, resplandeço. Não celebro
o pranto que me oprime
e esgota meus recursos
Por acaso
um dinossauro, uma baleia
– uma impressão de poucos dígitos
Num rappel à l'ordre faço a luz
e o espaço
constitui minha colagem
– me acolhe num espelho
incoerente

2
Paraliso minhas
folhas de papel
e o poema perde o cálculo, o metal, a
urgência que o acordoa
e meu corpo se desfaz
– velado extrato
a raptar o mundo
O que me resta
rumoreja
me leva pra fora
despe
agride
sodomiza

3
Excluo apegos
e de vez
me torno em
torno de mim
Se me falam
não respondo
Se me tocam
me desvaio, devoro
a língua –
sujo a tábua rasa
de minha alma
– pinto um pôr-do-sol
e então fujo –
finjo que
não ouço
minha aula
de guitarra

Um comentário:

  1. Anônimo17.8.10

    O poema começa com palavras violinos, intocáveis, e quando quase sopro, surge o estridente e encantador murmúrio da guitarra. Muito bom!
    Andréia Carvalho

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