quinta-feira, 26 de agosto de 2010

A POÉTICA DIONISÍACA DE AL BERTO

Rodrigo da Costa Araújo

A impressão digital estampada, em close, na capa do livro O Medo, de Al Berto, nome literário de Alberto Raposo Pidwell Tavares (1948-1997) e as epígrafes postas acima, emblematizam a escritura al bertiana picada pela paixão do múltiplo, do fragmento e pela perda do toque da identidade. O corpo em cena, ora revelando-se, velando-se, lido como receptáculo nessa apresentação, sensível e carregado de disfarces, entrega-se ao olhar hipnótico e sedutor do leitor, que o induz a visualizar e descrever o delírio.

Esse corpo de mistérios, ele mesmo jogo entre l’obvie et l’obtus, entre o visível e o invisível que, a luz da interpretação ou pelo olhar atento do leitor/espectador, torna-se, agora, a enunciação ou território, numa estrutura opaca, sombria e enigmática. Quem lê os poemas de Al Berto percebe, além desses recursos estilísticos das capas de seus livros, - corpo-imagem, corpo-texto -, as relações de sua produção com as outras artes, outras linguagens, entende-se o sentimento narcísico e desesperador por um desejo de se converter em poema. Sua gestualidade, à feição de um texto a ser decifrado, de um corpo que trama as suas vias e desvios, compõem-se igualmente de nomes falsos, troca de identidades, operação de truques e espelhamentos de mundos, reduplicando metaforicamente a produção artística. Suas poesias instauram o complô: o escritor, ao agir como criminoso, no roubo das citações de textos alheios, forja, ainda identidades, e se esconde atrás de máscaras; o leitor-crítico, por sua vez, ao destrinchar essas pistas, dirige seu olhar para tudo que inspira suspeita e conspiração.

Esgarçando os limites entre Alberto e Al Berto sua poesia é fruto de um narcisismo - como também fez Oscar Wilde, em O Retrato de Dorian Gray - de uma elaboração dramática perceptível em seus versos. Al Berto, nesse sentido, e ao gosto do Decadentismo, assume-se como imagem para ser contemplada, como esteta e função pública, como pose esgarçada ao limite. Suas fotografias, tomadas como parâmetro, paratextos e recompiladas nas capas de sua obra representam visualmente o texto como recurso e encenação de sua produção artística, escondem ou revelam o corpo integrando-o como temática.


(Leiam o texto integral deste ensaio na Zunái, na página http://www.revistazunai.com/ensaios/rodrigo_da_costa_araujo_poetica_dionisiaca.htm)

Nenhum comentário:

Postar um comentário