Severo Snape lê a poesia completa de Bruno Tolentino em aramaico
 
entre um gole de suco de abóbora
 
e um gesto teatral com sua capa preta.
 
Lord Voldemort bebe sangue de unicórnio,
 
escreve 65 sonetos neoclassicistas
 
e faz anotações em seu blog sobre a crise da poesia
 
na pós-modernidade.
 
Bombas de fósforo branco caem sobre Gaza, Bagdá, Beirute,
 
minas terrestres explodem em Luanda e Maputo,
 
indiferentes a discussões estéticas sobre Manuel Bandeira
 
ou o último desfile da São Paulo Fashion Week.
 
Poetas brasileiros imitam limitações de Drummond,
 
falam de lirismo e subjetividade,
 
e vão empilhando diminutivos e palavras singelas
 
no jazigo de CDA, como ex-votos.
 
Lucius Malfoy tem uma coleção de bonecas lésbicas estranguladas
 
em sua casa mal-assombrada;
 
aqui, poetas brincam de boneca, em total desassombro.
 
Die Narbe der Zeit
 
tut sich auf
 
und sezt das Land unter Blut -
 
Die Doggen der Wortnacht, die Doggen
 
shlagen nun an
 
mitten in dir.
 
("a cicatriz do tempo
 
abre-se
 
e afoga a terra em sangue -
 
Os dogues da noite das palavras, os dogues
 
atacam agora
 
bem dentro de ti").
 
Paul Celan acordou do pesadelo da história nas águas do rio Sena
 
sem nenhum desassombro.
 
Poesia é algo que faz as palavras cantarem
 
- não como alaúdes (ataúdes)
 
mas como nervos expostos da linguagem.
(Editorial do n. 10 da Zunái, publicado em agosto de 2006.)
quarta-feira, 18 de agosto de 2010
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