Há muito tempo não existe jornalismo literário no Brasil. Houve o jornal Nicolau, nas décadas de 1980-90, editado por Wilson Bueno; o caderno Folhetim, da Folha de S. Paulo, no mesmo período; o Suplemento Literário de Minas Gerais, que teve sua melhor fase no final da década de 1990, sob a direção de Carlos Ávila, mas que sobrevive até hoje, e por vezes surpreende com bons textos e autores; a revista CULT, mais recente, que apesar de sua explícita parcialidade, divulgou muita coisa da poesia contemporânea; e hoje, o que há? Os cadernos ditos culturais da imprensa diária estão comprometidos com os lançamentos das grandes editoras, que muitas vezes são anunciantes nesses mesmos veículos. O espaço dado a livros lançados nos EUA ou na Europa não raro é maior que o espaço dedicado a escritores brasileiros. E, claro, a prosa de ficção (o romance, em especial) tem muito mais destaque do que a poesia, não por qualquer critério de qualidade estética, mas apenas porque vende mais. Não se trata de jornalismo literário, mas de um serviço de assessoria de imprensa para as grandes editoras. Quem é do ramo sabe disso. Felizmente, para me atualizar e saber o que está acontecendo de interessante na poesia e na prosa de hoje, eu não preciso consultar a lista de “mais vendidos” da VEJA (uma piada de péssimo gosto), nem ir à FNAC com uma lente de aumento, para descobrir algum volume de poesia excêntrica e invendável, escondido entre pilhas de romances sentimentais e livros de auto-ajuda. Afaste-se de mim, Satanás! Eu sei o que acontece hoje acessando blogues e sites de literatura, como Cronópios e Germina, além de receber, todos os dias, pelo correio, livros enviados a mim por autores dos quatro cantos do país, que é claro eu demoro um pouco para ler. Entre esses livros recebidos, gostaria de citar alguns, inclusive para indicá-los a vocês: Saber o sol do esquecimento, de Casé Lontra Marques (Vitória: Aves de Água, 2010), um poeta jovem do Espírito Santo com um trabalho de linguagem muito refinado; A sombra da ausência, quarto livro de poemas de Antônio Moura (Bauru: Lumme Editor, 2009), sem dúvida um dos mais talentosos autores brasileiros; e o volume de ensaios As ironias da ordem, de Maria Esther Maciel (Belo Horizonte: editora da UFMG, 2010), a crítica literária e pesquisadora mais inteligente e bem-informada que temos hoje na universidade, em minha não-modesta opinião. Recebi também alguns livros instigantes da Gran Cualquierparte: Charles Perrone, o embaixador da poesia brasileira nos EUA, enviou-me o seu livro Brazil, lyric, and the Americas (University Press of Florida, 2010); Armando Roa Vial, da nova geração de poetas chilenos, mandou-me um exemplar de Ejercicios de filiación – Poesía (1998-2008) (Santiago de Chile: Editorial Universitária, 2010); e Casimiro de Brito, um nome histórico da poesia portuguesa, expoente da Geração 61, enviou-me Na Via do Mestre (Coimbra: ed. Temas Originais, 2010), em que ele faz um diálogo/paródia com os textos do Tao Te King, de Lao Tzu (uma das afinidades que temos em comum é o interesse pelo haicai, pela poesia e filosofia da China e do Japão). Outra grata surpresa foi o livro Como un proyecto del que nadie habla, do uruguaio Roberto Echavarren, que é uma tradução para o espanhol de Like a project of which no one tells, de John Ashbery (Montevidéu: La Flauta Mágica, 2009). Com amigos assim, que me enviam livros fascinantes, quem precisa da VEJA e da Folha de S. Paulo?
quinta-feira, 17 de junho de 2010
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Nossa... Eu colecionava os exemplares do Folhetim, desde 77 ou 78, se não me engano, Claudio. Se eu procurar no meio dos meus guardados talvez ainda encontre alguns. A novidade eram as cores, mas com certeza foi muito além do visual. Eu me atualizo por aqui, além de alguns outros sites e blogs especializados. Este tabalho que vocês fazem não tem preço. beijo.
ResponderExcluirPrezado Prof. Claudio Daniel
ResponderExcluirDiscorrendo sobre os tantos mimos que recebeu ficamos todos a invejá-lo. Só nos cabe correr a uma livraria e adquirir ao menos uma de suas indicações.
Nydia, eu colecionava o Folhetim; hoje, tenho poucos exemplares, e me arrependo muito de ter perdido a maior parte da coleção.
ResponderExcluirBeso,
CD
Celso, na Livraria da Vila, e em especial na loja da Vila Madalena, há uma seção de poesia muito boa, às vezes você pode encontrar lá livros de autores contemporâneos. A livraria da Casa das Rosas é outra dica; em ambos lugares, é possível encomendar títulos que não se acham nas prateleiras ou em estoque. A Livraria Cultura é boa em muitas áreas, mas não em poesia. Abraço,
ResponderExcluirCD
Caro Cláudio, lendo seu post fiquei tentado a lhe enviar meus livros, embora considere a possibilidade de não ser seu estilo de poesia preferido. Fiquei encorajado ao supor que os livros que você relaciona divergem bastante em estilo, e também por causa de seus elogios a Maria Esther Maciel. Talvez valha nem que seja para o seu mero conhecimento; talvez para estabelecermos um contato mais estreito. Não tenho seu e-mail. E, obviamente, preciso de um endereço postal. Enquanto isso, penso em tentar conseguir alguns desses livros, inspirado pelos títulos.
ResponderExcluirCaro Alexandre, você pode escrever para o meu e-mail, claudio.dan@gmail.com, aí eu lhe informarei o endereço postal. Gosto de várias formas de poesia, desde que com trabalho elaborado de linguagem. Abraço,
ResponderExcluirCD