MONUMENTO A PASCAL
I
Nunca buscamos as coisas,
mas sim a busca das coisas.
O rei está rodeado de gente
que não pensa senão em divertir o rei
e impedi-lo de pensar em si mesmo.
Com o coração oco
e cheio de imundície
corremos despreocupados
para o abismo – o último ato,
sempre sangrento, por mais belo
que tenha sido o resto da comédia.
II
Três graus de latitude alteram
toda a jurisprudência:
Um meridiano decide a verdade.
Curiosa justiça que um rio delimita.
Do outro lado do mar, um homem
se dá o direito de me matar,
só porque o seu príncipe tem
uma disputa com o meu,
embora, eu, contra ele, nada tenha.
Meu e Teu – eis o começo e a imagem
da usurpação de toda a terra.
III
Quantos reinos nos ignoram.
Abismado na infinita imensidão
dos espaços que ignoro e me ignoram,
não vejo – como uma sombra
que dura um instante irreversível –, senão
infinidades por todos os lados,
visivelmente perdido e caído
nas trevas impenetráveis
do Universo que me encerram.
Uma esfera infinita, cujo centro
está em toda a parte e a circunferência
em parte alguma.
Deus é um Deus escondido.
IV
Nunca nos detemos no presente.
E nada se detém para nós – rio de Babilônia.
Não procuremos, pois, segurança
nem firmeza.
De nada me adianta possuir terras.
Pelo espaço, o Universo compreende-me
e absorve-me como um ponto.
Pelo pensamento, sou eu
que o compreendo.
V
A medida que aumentam as luzes
aumentam grandeza e miséria,
desde a presunção desmedida
ao mais horrível abatimento.
A natureza do homem, bambu pensante,
não é ir sempre, tem suas idas
e vindas.
Monstro incompreensível, não é anjo
nem besta e, desgraçadamente,
quando quer ser anjo
acaba por ser besta.
O frio é agradável
para podermos aquecer-nos.
Tenho dentro de mim
o tempo bom e os nevoeiros.
VI
Dirigimos o olhar para o céu,
mas firmamo-nos na areia.
Um princípio de tudo.
Tudo por Ele,
Tudo para Ele.
Incapazes de ignorar totalmente
e de saber com certeza,
temos uma imagem da verdade
e possuímos a mentira.
Glória e refugo do universo.
VII
O menor movimento importa à natureza.
O mar inteiro muda por causa de uma pedra.
Nenhum abatimento incapaz do bem.
Nenhuma santidade isenta do mal.
Esplêndida maneira de receber
a vida e a morte, os bens e os males.
Paris, verão de 2004
(Leiam mais poetas do Pará na antologia organizada por Nilson de Oliveira para a Zunái de maio.)
quinta-feira, 22 de abril de 2010
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Eita, que estes poetas do Pará são bons demais - terra fértil, safra boa. Abraço.
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