domingo, 21 de julho de 2013

UM CONTO DE JOÃO ANZANELLO CARRASCOZA

SEDE



O rio, o rio fluía, quieto, na noite. O luar era tão luar, que do rochedo onde eu estava, pude ver a mulher emergir das profundezas e nadar de costas até a margem. Ela saiu da água e veio em minha direção, devagar, gotejando-se no caminho. Parecia que o mundo andava na ponta de seus pés. Embora eu temesse me afogar na sua sombra, a cada um de seus passos o receio ia se despedindo de mim. Ao redor, as coisas em excesso pediam licença, silenciosamente. Estávamos nos esvaziando. Ela movendo-se. Eu, imóvel. Logo, chegou ao rochedo e se sentou à minha frente. Não recordo o que conversamos, apenas que não podíamos dar às palavras o contorno que as definiam como palavras. O céu com suas estrelas, lá de cima, nos observava. Então, abracei-a, farejando a sua pele, o seu cheiro de água. E, para saciar a minha seca, comecei a beber, sem pressa, o rio que nela fluía.  

(Leiam mais contos de João Anzanello Carrascoza na edição de agosto da Zunái.) 

Nenhum comentário:

Postar um comentário