terça-feira, 22 de setembro de 2009

CONFISSÕES INCONFESSÁVEIS

Comecei a ler poesia aos 13 anos, com as Flores do Mal, de Baudelaire, e o Corvo, de Edgar Allan Poe. Meu pai, que sabia de cor os versos de Vou-me embora pra Pasárgada, insistiu para que eu lesse Manuel Bandeira. Confesso que a primeira impressão que tive após ler a Estrela da Vida Inteira foi a de pura e simples indiferença: “não é Baudelaire”, devo ter pensado na época, “não é Rimbaud, nem William Blake, nem Maiakovski”. Eu não entendia como alguém que escrevia versos como “Para cá, para lá... / Para cá e... / — O novelozinho caiu” era considerado um grande poeta. Mesmo os versos de Pasárgada, que levavam meu pai às lágrimas, eu achava banais e previsíveis. Claro, entre o final da adolescência e as aulas de literatura brasileira no cursinho eu pude aceitar a sua importância histórica, de “São João Batista do Modernismo”, e, mais do que isso, um homem de cultura enciclopédica, bom ensaísta, crítico, tradutor e raro conhecedor de poesia latino-americana contemporânea. Sem dúvida, um dos maiores intelectuais que tivemos em nossa literatura.

Porém, relendo a Estrela da Vida Inteira, em diversas fases de minha vida, até os dias de hoje, noto que minha opinião sobre a poesia de Manuel Bandeira pouco mudou: não gosto do uso de diminutivos, que, a meu ver, tornam os versos tolos (“Santa Teresa não, Teresinha... / Teresinha do Menino Jesus”); irritam-me as “ternurinhas” do poeta com o seu porquinho da índia, o tom ingênuo-sentimental de boa parte de sua produção (ele foi um herdeiro da poesia romântica e simbolista, como Cecília Meireles), a coloquialidade prosaica, as fotografias de cenas cotidianas, inspiradas em crônicas de jornal... tudo isso, sempre achei muito, muito chato, algo que não me diz respeito, simplesmente.

Eu curtia sim, e curto até hoje as invenções de Oswald de Andrade (em especial a prosa poética de Memórias Sentimentais de João Miramar), a música dissonante de Raul Bopp (Cobra Norato), as imagens poéticas de Murilo Mendes (Siciliana e Tempo Espanhol, sobretudo), alguns versos da Invenção de Orfeu, de Jorge de Lima, a Rosa do Povo e a Máquina do Mundo, de Drummond... mas, de Manuel Bandeira, eu poderia fazer uma antologia com apenas 30 poemas (sendo o meu favorito, até hoje, o Pneumotórax, com a sua deliciosa crueldade). Claro que não é qualquer um que escreve poemas como Evocação do Recife, e escrever apenas um bom poema pode ser a justificativa de toda uma vida de trabalho literário. Agora, não o considero um poeta da mesma estatura que Murilo Mendes, Carlos Drummond de Andrade ou João Cabral de Melo Neto.

5 comentários:

  1. Manuel Bandeira diz de Machado de Assis, que se não considerado era um grande poeta, deixou-nos cerca de dez poemas importantes, que merecem ser lembrados - coisa de grande poeta. E você diz que Manuel Bandeira deixou-nos trinta... Oras, João Cabral deve ser o mais importante poeta que tivemos, mas soube aproveitar a lição de Manuel Bandeira no criar imagens com as coisas. Bandeira não foi só o inho, há muito ão a se considerar.
    Abraços.

    ResponderExcluir
  2. Caro, sem dúvida, Bandeira trouxe informação nova para a poesia brasileira, como o uso do verso livre, maior objetividade na construção de imagens, mas, na minha opinião, ele não deixou uma obra com um número apreciável de poemas; e não conheço, em sua obra, um poema comparável à Máquina do Mundo ou à Psicologia da Composição. Acho um bom poeta, mas não um grande poeta. Acho sua influência excessiva no meio universitário, e até pouco salutar aos jovens poetas que o imitam (mal). Abraço,

    CD

    ResponderExcluir
  3. Claudio, concordo sobre Bandeira, embora também me recorde de uns 10 poemas dele de que eu gosto bastante.
    Sobre Drummond, João Cabral e Murilo: acho que são mesmo os três maiores aqui, mas ainda sinto falta de ver mais nas bibliotecas os livros deste último. Acho que, em relação ao que estudamos de Drummond e João Cabral, as obras de Murilo ficam meio que de lado. Também, não por menos: a poesia completa e prosa dele, que eu estava querendo comprar, está na faixa de R$ 350,00... Não sei por que acabei desistindo! Enfim... Na minha opinião leitora, e não de entendedora, acho que Murilo Mendes poderia ser mais disseminado, lido e estudado.

    ResponderExcluir
  4. Andresa, o problema é que a universidade brasileira criou um cânone que endeusa Bandeira e Drummond e coloca em segundo plano autores essenciais como Oswald de Andrade, Raul Bopp, Murilo Mendes e João Cabral (para não falar da Poesia Concreta, ainda não assimilada após 50 anos...). O Murilo, em especial, durante décadas, esteve ausente do mercado editorial brasileiro (circulava aqui apenas uma pequena antologia, de pouco mais de cem páginas); de uns dez anos para cá, começaram a editar uns dois ou três títulos dele, incluindo as Obras Completas, a um preço impeditivo. Isto é um absurdo, pois é um poeta central do Modernismo brasileiro, e a meu ver muito, muito, muito mais instigante do que Manuel Bandeira! Tempo Espanhol, Siciliana e Convergência, em particular, são livros de Murilo que mereciam edição independente das Obras Completas, para facilitar o acesso aos leitores... beso grande do

    Claudio

    ResponderExcluir
  5. Oi, Claudio, eu também só consegui nas bibliotecas daqui (Passo Fundo, a Capital Nacional da Literatura, huashuashuahs) uma antologia do Murilo. Não lembro onde li um ensaio em que o autor comentava haver uma certa dificuldade em se reunir os textos do Murilo (não tanto a poesia quanto os ensaios e outros textos em prosa), porque ele teria publicado muitos de forma esparsa na imprensa. Raul Bopp, bem lembrado, e tbm acho Mario Faustino um grande poeta esquecido.
    Então, é isso... Esses caras acabam injustamente ficando de lado.
    Grande beijo,
    Marceli

    ResponderExcluir