quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

ATAQUE DE ISRAEL É CRIME CONTRA A HUMANIDADE, DIZ RELATOR DA ONU



Os ataques de Israel na faixa de Gaza constituem um crime contra a humanidade, afirma Richard Falk, relator especial da ONU para a situação dos Direitos Humanos nos Territórios Palestinos Ocupados. "Trata-se de um ataque com armas modernas a uma sociedade sem condições de se defender. Há o uso desproporcional da força contra uma sociedade", disse Falk em entrevista coletiva realizada nesta quarta (dia 7) em São Paulo. "A situação foi agravada pelos 18 meses de bloqueio que impede o envio de suprimentos como alimentos e medicamentos. Isso já é uma infração ao Direito Internacional Humanitário", acrescentou.

Segundo as normas jurídicas que compõem o Direito Internacional Humanitário, que inclui a Convenção de Genebra, a potência ocupante deve oferecer os meios de sobrevivência à população da região ocupada, o que não está ocorrendo na atual onda de violência na faixa de Gaza, segundo Falk. Na madrugada desta quarta (7), o primeiro-ministro israelense Ehud Olmert havia anunciado uma trégua de três horas para o envio de ajuda humanitária. Por volta das três horas da tarde de hoje (meio-dia no horário de Brasília), os conflitos foram retomados perto da Cidade de Gaza.

Para Falk, há ainda um agravante "sem precedentes" na história recente de conflitos militares. "Em qualquer guerra moderna, há um grande número de refugiados. Israel, no entanto, impediu que os palestinos se tornassem refugiados, que deixassem a zona de conflito. Isso é um fato inédito", disse.A alegação de Israel de que não há crise humanitária e de que os ataques têm caráter defensivo não se sustenta, segundo ele. "Observadores independentes confirmam que há uma crise profunda que afeta física e mentalmente a população de Gaza", diz Falk.

"Chamar essa operação militar de defesa é uma distorção de linguagem que surpreenderia até (George) Orwell, que escreveu o livro '1984'. Nenhum israelense foi morto nos 12 meses anteriores aos ataques de dezembro. Os feridos só surgiram após dezembro. A operação de Israel já provocou a morte de 700 palestinos e deixou cerca de 3.000 feridos. Enquanto isso, quatro militares de Israel morreram por fogo amigo", argumenta Falk.

Apesar dessas violações, há dúvidas se o governo israelense poderia ser julgado por uma corte internacional porque Israel não é membro do Tribunal Penal Internacional. "Dependendo da gravidade das violações que forem constatadas, teria que ser instalado uma corte especial, como foi o caso de Ruanda", afirmou Falk.
Edilson Saçashima
Do UOL Notícias
Em São Paulo

2 comentários:

  1. GAZA, por José Saramago:

    A sigla ONU, toda a gente o sabe, significa Organização das Nações Unidas, isto é, à luz da realidade, nada ou muito pouco. Que o digam os palestinos de Gaza a quem se lhes estão esgotando os alimentos, ou que se esgotaram já, porque assim o impôs o bloqueio israelita, decidido, pelos vistos, a condenar à fome as 750 mil pessoas ali registadas como refugiados. Nem pão têm já, a farinha acabou, e o azeite, as lentilhas e o açúcar vão pelo mesmo caminho.

    Desde o dia 9 de Dezembro os caminhões da agência das Nações Unidas, carregados de alimentos, aguardam que o exército israelita lhes permita a entrada na faixa de Gaza, uma autorização uma vez mais negada ou que será retardada até ao último desespero e à última exasperação dos palestinos famintos. Nações Unidas? Unidas? Contando com a cumplicidade ou a cobardia internacional, Israel ri-se de recomendações, decisões e protestos, faz o que entende, quando o entende e como o entende.

    Vai ao ponto de impedir a entrada de livros e instrumentos musicais como se se tratasse de produtos que iriam pôr em risco a segurança de Israel. Se o ridículo matasse não restaria de pé um único político ou um único soldado israelita, esses especialistas em crueldade, esses doutorados em desprezo que olham o mundo do alto da insolência que é a base da sua educação. Compreendemos melhor o deus bíblico quando conhecemos os seus seguidores. Jeová, ou Javé, ou como se lhe chame, é um deus rancoroso e feroz que os israelitas mantêm permanentemente actualizado.

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  2. Bombardeio de Ashkelon é ironia trágica, por Robert Fisk (publicado no “Independent”)

    Como é fácil desconsiderar a história dos palestinos, apagar a narrativa de sua tragédia, evitar mencionar uma grotesca ironia sobre Gaza que em qualquer outro conflito estaria entre os primeiros fatos a serem mencionados pelos jornalistas: o fato de que os proprietários originais, legais, das terras israelenses que os foguetes do Hamas agora tomam como alvo vivem em Gaza.

    É por isso que Gaza existe: os palestinos que viviam em Ashkelon e nos campos vizinhos -Askalaan, em árabe- foram expulsos de suas terras em 1948, quando Israel foi criado, e terminaram nas praias de Gaza. Eles ou seus filhos, netos e bisnetos estão entre o 1,5 milhão de palestinos amontoados na fossa fétida de Gaza, onde 80% das famílias um dia viveram em terras que hoje pertencem a Israel. Esse é o verdadeiro assunto, em termos históricos: a maioria dos moradores de Gaza não vem de Gaza.

    Mas, ao assistir aos telejornais, seria de imaginar que a história começou ontem, que um bando de islâmicos anti-semitas, barbados e lunáticos subitamente irrompeu dos cortiços de Gaza e começou a disparar mísseis contra Israel, um Estado democrático e amante da paz, e por isso atraiu a justa vingança da Força Aérea israelense. O fato de que as cinco irmãs mortas no campo de Jabaliya tenham avós oriundos das mesmas terras cujos proprietários mais recentes as mataram em um bombardeio simplesmente não é mencionado.

    Tanto Yitzhak Rabin quanto Shimon Peres disseram, nos anos 90, que desejavam que Gaza simplesmente desaparecesse, e o motivo é compreensível. A existência de Gaza serve como lembrete aos israelenses das centenas de milhares de palestinos que perderam seus lares, que fugiram ou foram expulsos por medo da limpeza étnica que Israel conduziu 60 anos atrás, quando levas de refugiados ainda vagueavam pela Europa e um bando de árabes expulsos de suas terras não preocupava o mundo.

    Bem, o mundo deveria se preocupar, agora. Aglomerado em uma das regiões mais superpovoadas do planeta vive um povo que mora em meio ao lixo e aos esgotos e, nos últimos seis meses, vive sem energia elétrica ou comida suficiente, vítima de sanções impostas por nós, o Ocidente.

    Infelizmente para os palestinos, a mais poderosa voz política -e falo do intelectual Edward Said, e não do corrupto Iasser Arafat (que falta os israelenses devem sentir dele no momento)- se calou, e o sofrimento deles não está sendo exposto ao mundo por seus deploráveis e tolos porta-vozes.

    "Trata-se do lugar mais aterrorizante que já visitei", disse Said sobre Gaza. É claro que coube à ministra do Exterior israelense, Tzipi Livni, admitir que "ocasionalmente os civis também têm de pagar", argumento que ela não apresentaria caso as estatísticas sobre mortos fossem revertidas. Se mais de 300 israelenses tivessem morrido, podem ter certeza de que os números seriam enfatizados.
    Descobrir que tanto os EUA quanto o Reino Unido se recusam a condenar a agressão israelense e atribuem a culpa ao Hamas não surpreende. A política dos EUA e a de Israel para o Oriente Médio se tornaram impossíveis de distinguir. Como de hábito, os sátrapas árabes, em larga medida bancados pelo Ocidente, optaram pelo silêncio e convocaram uma ridícula conferência de cúpula sobre a crise, que apontará um comitê para preparar um relatório que jamais será redigido.

    Pois é assim que funciona o mundo árabe e seus corruptos governantes. Quanto ao Hamas, ele com certeza apreciará o desconforto causado aos potentados árabes e esperará cinicamente que Israel dialogue com ele. E o diálogo acontecerá. Na verdade, dentro de alguns meses, seremos informados de que Israel e o Hamas vinham conduzindo "negociações secretas" da mesma maneira que um dia ouvimos a mesma notícia sobre Israel e a ainda mais corrupta OLP (Organização para a Libertação da Palestina). Mas, quando isso acontecer, os mortos já estarão sepultados, e nós estaremos enfrentando a crise que surgirá depois da mais nova crise.

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

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