segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

LETRA NEGRA (V a X)

V

“quando nada mais faz sentido” —
busco o mistério animal,
a ferocidade da noite:
deslizando por meus lábios,
ela se transforma, revoluta,
desentranhada, não me decifra,
não te devoro, abisma fábulas
na desordem dos cabelos,
entre pupilas, expandindo luas,
tensionando a pele, na cegueira dos mamilos.

VI

floresta de enganos, se me esmagam,
furiosos, com simulações,
é tua face que me escapa à pele;
se atravesso veredas infernais,
desalentado, paisagem de fraturas,
é apenas para encontrar-te,
tua imagem reversa é o meu labirinto.

VII

espaço vegetal, tempo lagarto:
mãos fluidas; voz movediça;
olhos de musgo, na pedra;
quem sou eu, nessa era líquida,
menos homem que número,
letra negra, fragmento do caos,
movendo-me à roda de teu nome?

VIII

flutuantes territórios
em que tudo é ambíguo;
larvais estatuetas, jades
instáveis, refratando ínferos.

IX

mulher-esfinge
disposta em meu sangue —
incisiva, configurada ao sol de duas faces,
quem é você, jardim, jaspe ou pesadelo,
serpe cabalística em cada unha,
tudo instável, tudo música e insanidade,
mas teu seio afundando em minha boca.

X

mulher-enigma
espelhada em meus ossos,
freqüentá-la, cada mistério,
umbigo e cabelos, de sua caligrafia
de reversos: inventá-la, reinventá-la
pétala, centaura, lupina, traquéia, tempestade.

7 comentários:

  1. Este poema é o nosso tempo.

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  2. Anônimo2.2.09

    Rose, grato; no mínimo, é um registro de como eu me sinto nessa época (e com algumas referências ao livro "Linguagens líquidas na era da mobilidade", de Lúcia Santaella, e também a alguns temas da física quântica, da filosofia taoísta chinesa e de meus pesadelos e obsessões pessoais). Beso do

    CD

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  3. Uma pergunta: a Casa das Rosas abre espaço para exposições de arte de novos artistas? (no caso, pintura). Abraços.

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  4. Anônimo3.2.09

    Analuka, você pode enviar uma proposta por e-mail para a Casa das Rosas, e ela será avaliada pelo coordenador visual da instituição. Boa sorte!

    Claudio

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  5. Identificação imediata com teu poema. A explicação acredito seja o preciso comentário da Rose.
    abraços

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  6. Anônimo4.2.09

    Rubens, agradeço pela visita e comentário!

    Abraço,

    CD

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