segunda-feira, 31 de agosto de 2009

DIÁRIO DE UM EX-FUMANTE

Eu fui fumante durante trinta anos. Comecei na época do colégio, aos 16 anos de idade, época em que sonhava ser o novo vocalista dos Rolling Stones, e parei aos 46 anos, já convencido de que a minha capacidade vocal não é a mesma de Mick Jagger (embora eu seja muito mais sexy do que ele).

Como parei de fumar? Fiquei uma semana hospedado na fazenda Nova Gokula, onde podia tomar banho de cachoeira, seguir trilhas na mata, comer pratos vegetarianos, cantar mantras e fazer exercícios de Tai Chi Chuan. Consegui ocupar minha mente com outras coisas, mais saudáveis, o que ajudou a combater o desejo de fumar.

Ao voltar a São Paulo, ocupei-me várias horas por dia a praticar exercícios físicos, Tai Chi e Aikidô, e a ler mais; sempre que sentia vontade de fumar, “mudava de assunto”, bebia um copo de água, pensava em outra coisa, e logo a vontade passava. Aprendi, então, que essa vontade surgiria várias vezes (até em sonhos), mas que era temporária; se eu aguentasse alguns minutos, logo ficaria livre dela.

Passei a comer doces, doces e mais doces, para compensar a abstinência; tomei mais refrigerantes e evitei álcool, café e carnes temperadas (depois, pude voltar a consumir essas coisas, sem problemas). Engordei 13 quilos (o que para mim não é problema, pois sempre fui magro: passei de 55 para 68 quilos). E notei que adquiri mais fôlego, força, vitalidade; a sensação de bem-estar físico compensa, e muito, o prazer limitado e sempre insatisfatório das baforadas.

Notei que o efeito do tabaco de acalmar a mente é impermanente, e que gera mais ansiedade e dependência; em vez de tranquilizar, agita mais a mente. Sem essa muleta psicológica, passei a usar outros métodos para me acalmar: ouvir música, praticar esgrima, passear num parque, recitar um mantra, brincar com meu filho.

Após oito meses de abstinência, posso dizer, sem demagogia, que hoje me sinto muito melhor, e que existe vida, e ótima vida, após o cigarro. Isto não significa que eu concorde com as políticas antitabagistas do sr. José Serra, a meu ver ações de marketing eleitoral, e não de saúde pública. Afinal, consideremos:

1) carros, ônibus e caminhões despejam uma quantidade incalculável de gás carbônico e outras substâncias tóxicas, diariamente, nas ruas de São Paulo. O que o governo do PSDB fez em relação a isso? Nada. Absolutamente nada.

2) Assim como o tabaco, o álcool também provoca doenças, mortes, acidentes de trânsito, problemas familiares e nos locais de trabalho. O que o governo do PSDB fez em relação a isso? Nada. Absolutamente nada.

3) É possível argumentar que, para evitar o controle do Estado sobre os direitos individuais do cidadão, alguns espaços dedicados apenas a fumantes poderiam funcionar legalmente (claro que os não-fumantes, sabendo disso, não frequentariam tais antros). O que o governo do PSDB fez em relação a isso? Nada. Absolutamente nada. (Como não fez nada para combater o trabalho ilegal de crianças e tirar os menores das ruas; é mais fácil proibir out-doors, como fez outro demagogo, o sr. Kassab.)

Temos governos que não se preocupam com a saúde, a educação, a cultura ou os direitos dos cidadãos, mas apenas com ações de marketing, que tenham visibilidade na mídia e possam ser usadas em campanhas eleitorais (como a populista Virada Cultural, que consome milhões de reais que poderiam ser utilizados em ações sólidas e duradouras de apoio à produção e difusão da cultura).

Sou ex-fumante, apóio ações educativas para a prevenção e combate ao tabagismo, que é uma doença grave, mas acho preocupante o Estado ditar normas em relação aos direitos dos cidadãos. Sinceramente, espero que, nas próximas eleições, o PSDB e seus aliados e amigos virem fumaça.

8 comentários:

  1. "Sinceramente, espero que, nas próximas eleições, o PSDB e seus aliados e amigos virem fumaça". perfeito, Claudio. e o direito de ir e vir dos cidadãos? penso que o que está acontecendo ai em são paulo é pura demagogia. abraços

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  2. Linaldo, grato, amigo. Lembro que, quando Serra concorreu à prefeitura, prometeu fazer uma "revolução na saúde". Porém, ficou pouco tempo no cargo e logo concorreu ao governo do estado, deixando a prefeitura com o ex-malufista Kassab. E o que aconteceu com a saúde? Tive um problema de tendinite, há meses, e fui a um posto de saúde. Esperei quatro horas para ser atendido, e depois fui encaminhado a outro posto, onde, supostamente, haveria um ortopedista. Não havia ortopedista nenhum lá, mas conseguiram agendar uma consulta para mim... com dois meses de antecedência! Como não estava a fim de continuar a sentir incômodo físico por dois meses, fui a uma clínica particular, gastando R$ 200,00 entre consulta e radiografia (mas resolvi o problema em pouco tempo). Essa é a "revolução na saúde" de José Serra e do PSDB?

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  3. Interesante, felicitaciones, es bueno ver-leer-escuchar esta manera de generar critica cultural a los politicos que nos creen y quieren tontos,

    abrazo afectuoso desde Santiago de Chile

    El Serra chileno se llama Piñera (se parece a Piraña, en cierta forma lo es)

    saludos

    Leo Lobos

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  4. Meudeus, voltei de uma consulta médica ontem com o veredicto "pare de fumar". Não sei nem por onde começar. Sem contar que meu sedentarismo tomou contornos irreversíveis nos últimos anos.

    Quanto à política anti-tabagista de não fumar em locais públicos, me parece uma balela daquelas sem precedentes. Não vai durar mais que dois meses de mandato.

    Outra: como podem estudar a liberação da maconha e proibirem o uso do cigarro ao mesmo tempo? Tudo bem que cigarro não dá barato, mas a maconha tem altos índices de alcatrão... Tudo bem que isso diminuiria (diminuiria?) a violência e combateria (combateria?) o narcotráfico, afinal a idéia é o usuário cultivar a erva em casa.

    Pensando isso tudo sob uma perspectiva de engodo, é bom a gente abrir o olho. Amanhã ou depois qualquer outra coisa pode ser nociva. Pra ser sincera, não confio nem na comida que compro no supermercado. Juro. bjs

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  5. Aninha, sugiro que você comece reduzindo o número de cigarros consumidos por dia... baixe de 15 para 12, por exemplo, durante uma semana... depois, reduza de doze para dez, ou para oito, por mais uma semana, e assim por diante... quando chegar a três por dia, faça uma viagem para algum lugar tranquilo, sem cigarros, e tente aguentar uns dias sem nicotina, lendo, passeando etc... é uma luta difícil, mas você pode vencê-la... acho que é necessária, sim, uma política de combate ao tabagismo; o que acho um grande erro é o Estado limitar os direitos individuais do cidadão... quem fuma deve ter o direito de fumar, em espaços reservados para fumantes em locais públicos, com a devida separação física que não incomode os não-fumantes... quanto a comida comprada em supermercado, bem lembrado, quem pode nos dizer quantas substâncias químicas ingerimos com cada folha de alface que comemos? Mas ninguém vai encarar os grandes fazendeiros, né? Beso do

    Claudio

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  6. Leo, grato pelo comentário! O PSDB, no Brasil, é o representante mais notório da política neoliberal, que fracassou em toda a América Latina... o abraço do

    Claudio

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  7. Logo que vi a notícia no jornal pensei só num lado da moeda - o meu, de nunca fumante nem ex-fumante nem nada. A ideia de frequentar bares legais sem precisar sair com o cabelo cheirando a fumaça, além de evitar outras desvantagens no quesito saúde mais diretamente, foi o que de imediato me deixou facceeeiiraaa. Não tinha pensado ainda nisso que você colocou, mas agora vejo que realmente faz sentido. Belo texto, bons argumentos. A questão toda precisaria ser repensada.

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  8. Anônimo4.9.09

    Andressa, como bom ex-fumante que se preza, evito ao máximo ficar próximo à fumaça de cigarro; antes, era porque me dava vontade de voltar a fumar, e agora, porque não gosto do cheiro, mesmo. Porém, respeito quem fuma, e acho que deve haver espaços próprios para os fumantes. Caso contrário, seremos participantes de uma prática de intolerância, fomentada pelo Estado, que contraria os direitos individuais. Beso do

    Claudio

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