Para Murilo Mendes
& a resistência
palestina
I
Rosa
de nenhuma
lua.
Caminho só
numa noite
escura
com os cabelos
já esbranquiçados
e as mãos
trêmulas
mudas.
O relógio
é inútil
como um pássaro
cego
perdido em meio
a chuvas
de fósforo
branco.
II
Em Khan Yunis
cidade de meus afetos
crianças correm
queimadas
como em Saigon
e desta vez
não há fotógrafos
para imortalizá-las
só o silêncio
criminoso
do oligopólio midiático.
III
Onde estão
as rotas
de fuga
a ponte
do arco-íris
as valquírias
de Odin
os anjos
terríveis
de Rilke
em meio
a escombros
placas de metal
retorcidas
arquitetura inacabada
de uma cidade
em ruínas
que os deuses
contemplam
bebendo jarros
de terra calcinada
misturada
a urânio empobrecido?
IV
A morte é um cristal
violeta que reflete ossadas.
A morte é um cântaro esquelético
sem teus seios.
A morte é o cavaleiro do
mundo delirante
que passa uivando sob a
minha janela de tijolos vermelhos.
V
Envelhecer é contemplar
a rosa
de nenhuma
lua
borrar o reflexo
no espelho
com uma faca
curva
de água
beber
uma xícara
de chá
com os corvos
de meus pesadelos
enquanto triunfam
em seu apocalipse
os turvos
açougueiros.
Poema inédito de Claudio Daniel, 2024
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