domingo, 6 de setembro de 2015

CONFISSÕES INCONFESSÁVEIS (I)


Conversei com Mário Schenberg uma única vez, nos remotos anos 1980. Ele morava numa casa ampla, com quadros e obras de arte por todos os lados. Surpreendeu-me ouvir de um dos maiores físicos da segunda metade do século XX e marxista convicto, membro do Comitê Central do antigo PCB, um discurso semelhante ao de Erich von Daniken, autor de "Eram os deuses astronautas?". Mário acreditava que houve intercâmbio entre alienígenas e antigas civilizações, como as dos maias e astecas, e acompanhava a ufologia com interesse. Também estudava religiões orientais, como o taoísmo e o zen-budismo (após o seu falecimento, conforme instruções que deixou à família, recebeu cerimônia fúnebre em um templo budista). Mário também era grande interessado em poesia e, após ler minhas tímidas e arrogantes produções de mocidade, fez um único comentário: que após o Modernismo os poetas usavam e abusavam dos substantivos, mas se esqueceram dos verbos. Nunca me esqueci dessa lição e até hoje, em meus poemas, busco a diversidade de verbos e tempos verbais. Também aprendi com ele a não ser sectário, manter a mente aberta e entender o marxismo como ciência social útil para a compreensão de diversos aspectos da realidade, mas não a sua totalidade. Sou marxista em política, em economia, o que não me impede de flertar com outras filosofias e formas de compreensão do mundo, em campos que escapam ao repertório teórico, métodos e estratégias do marxismo – e não vejo nisso nenhuma heresia ou contradição: o próprio Marx considerava que o socialismo não seria a destruição de todas as conquistas culturais do passado, mas, ao contrário, seria a conclusão lógica do avanço das forças produtivas, ciência, tecnologia e cultura desenvolvidos pela humanidade.

Nenhum comentário:

Postar um comentário