sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

DOIS POEMAS DE ROBERTA TOSTES DANIEL


ONDE A VEGETAÇÃO SE RASGA


Onde a vegetação se rasga
Para o sol, o sangue
O rastro da fuga

Verde,
Vermelha
Selva – me suga

Como a mais pura seiva:
Mãos na palavra
Nua.


AINDA

No silêncio: compasso de solidão.

Depois que a música (me) acaba,

Fazer o sem-lugar onde desvio

Linguagem e desejo.

Fremir de ondas

Entre mim e canção,

Escrever as pausas de outra:

Mais sutil, de sombra.

O que eu não toco: pertença minha

(toda escuta, posse).

Onde não sou e não tenho;

Até que ouço, simplesmente.

Presa por vontade

De escutar o que é livre:

O inalcançável movimento

Do mar -

O chamado:

Palavras instigando ondas.

Ouvir o tempo insondável

No mesmo silêncio de corredores e sótãos.

Menina, lia. Escutava Quintana

Onde todas as canções comandam a nau

Apinhada de meninos mortos.

Terrível-suave.

E virgem. O silêncio virgem.

Ocupá-lo com desejo e memória,

Violentá-lo. Se tento calar,

Bebo o tempo: nau frágil.

Um ponto afogado e luminoso da escada,

Perto do peito: o porão do prédio.

Sou eu, um barco ainda ouvindo em segredo.

Degredada em sombra.

Um buraco de luz; deixada pela canção

E pelas brechas nos tijolos.

Abri a porta para o vazio.

Veio a rebentação. Nem perto o mar.

Os vizinhos não sabem; suas casas quando acendem;

Luzes me arrebentam faróis no peito.

As cortinas me abrem. Não saí do quarto.

Tudo veio à voz, depois da voz, minha voz sibilante.

O corredor ainda grande.

Meu sem-lugar: linha do tempo.

Tento uma ausência. Tudo lembrando.

Imagens correm, três delas, ardendo.

O novo. Arrebenta o novo. Oscilações de novo.

Até mesmo no fogo. Tudo são águas.

É um estar-se preso, realmente

(como no amor).

Quem ouve o silêncio, sem fim,

Devorando quem canta,

Move o sagrado, morre em mim.

Não só leveza. Todo instante é um corte,

Toda delicadeza funda o sal na voz

E um corte sempre fala ao dentro.

Arde o vigoroso.

A carne não é rente;

Requentada no sangue, vem antes

(na alma do que não fomos).

Nos afogamos.

A palavra, aprende:

Vai fracassar.

Como a música, seu fim.

Um tempo de mortes, no sempre.

Mas não enquanto:

O canto

2 comentários:

  1. Uma honra estar aqui. Abraço!

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  2. Anônimo19.12.11

    Que coisa linda ver a Beta por aqui, Claudio!

    Ela merece! ;)

    \^^/

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