terça-feira, 2 de dezembro de 2014

CADERNOS BESTIAIS (VI)















JAMAIS

Para Fabrício Slaviero

bichos de verde-muco proliferam
nos entalhes do tapume;
antiaranhas deslizam
nas ramagens,
tramam teias e resíduos
de uma dor vermelha,
recíproca.
há um plasma em cada fenda,
em cada vão
de madeira apodrecida.
há um acre açafrão
em cada veio
do reboco, com seu ácido.
tateiam algo, quem, aqui –
ou apenas arrulhos, crostas, escaras,
ninguém com óculos de aro fino,
breve gravata lilás e uma refinadíssima
sensibilidade no olfato; não, ninguém,
nunca houve, jamais.

2014


ARAMES, RETALHOS

esqueletos do nunca
onde o áspero da palavra,
brutais de dezembro.
porque esta não é a minha língua:
retorcidos de mistério,
caranguejo onagro.
onde se desdobra a pedra, onde se
desdobra o nojo desse nunca,
que se anuncia indesejoso:
são palavras em seu verde, em seu asco;
são vértebras de escárnio,
entulhos-de-orelhas à procura da mulher-dos-gatos.
porque nada faz sentido, eu sei,
neste reverso em que me falas,
primitiva, reverberante,
com a nudez que me calam os arames, os retalhos;
com a nudez de um estuque de plantas,
ruidosa, em expansão — e só me resta confessar
os fumos de aranha, inconcluso,
quando indagas sobre o meu labirinto.

2011 

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