terça-feira, 17 de março de 2009

UM ENSAIO DE EDUARDO MILÁN (III)

A política estética da pós-modernidade absorve essa consciência do passado. Partindo da base que os laços com o passado estão rompidos definitivamente, vai buscar ali os cumes eufóricos desse tempo, os momentos de maior prestígio — não os de maior temperatura estética — e, em um efeito de mímesis atemporal, “recupera” para o presente os momentos de opulência de um tempo que já nada tem a ver com o passado, nem com o presente que derive dele. Deste modo, se des-historiciza o passado e, em conseqüência, também o presente. Se instala assim um novo cânone que dá brilho ao passado em virtude da perda da aura do presente e de uma cega perda da fé no futuro, por considerar este tempo já perfeitamente conhecido em seus distintos graus de erro. O futuro, para esta posição tão precisamente ideológica, corresponde à já provada impossibilidade de uma verdadeira mudança no campo social e, ao mesmo tempo, ao silêncio da escritura. Porém, o que supõe em verdade esta recorrência ao passado prestigioso e seguro é uma abolição temporal e, por isso mesmo, uma estética da simultaneidade (todos os tempos e todas as formas estão aqui etc.). Ocorre algo mais grave ainda: se apaga assim, de um só golpe, o próprio conceito de tradição. A tradição deixa de ser um produto, um devir, um tecido, e a história perde seu efeito narrativo ao transformar-se em “estágios de tempo”, em cristalizações que já não se ligam entre si. Desta maneira o fragmento, desprendido de seu contexto estético, passa a ser a forma da história. Finalmente, aqui aparece a função da narração: ela se torna o recurso para encadear um tempo que não cessa de voltar para si mesmo. o relato, a arte de narrar, passa a adquirir o sentido da história que, por sua vez, se esvazia de significado. A narração poética corre, por último, o risco de ser a forma legitimadora de um discurso histórico vazio.

(CONTINUA)

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