sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

NOVOS POETAS BRASILEIROS (XIX)

I


Quanto menos se dorme

mais Lynchiana a realidade parece

não ver coelhos agindo de forma humana na sala

não significa a ausência deles

eles estão lá, mas quanto menos se dorme

mais normal o absurdo se torna

e mais petrolífera a noite se apresenta

como se anjos borrifassem gasolina nos olhos

para confundi-los e fazê-los crer

que o néon na calçada é luz divina



Quando não se dorme

somem as distâncias

apenas automatismo

dos passos dirigindo-se

até o dragão de quarenta lugares

que vai pro centro da espiral

porque não dormir é uma maneira

de ser abstrato e parecer contínuo

perpétuo movimento cerebral

mesmo quando não há sono

há sonho.



II

Buscar é a condição dos homens e alcançar é conquista divina. o alcance nem sempre é uma vantagem porque deus errou nas suas escolhas e respirar pequenas felicidades encontradas onde ninguém vê é a forma mais pura de fé. por aí estão disputando o corpo dele, repartindo seus pedaços todo dia pão às avessas, mas o alimento e o nome do criador provém dos medos humanos. deus no campo azul do poder, onde os homens o colocaram e onde ele brinca de Iscariotes − sarcasmos nos sacrifícios.


III

Somos maiores

somos maiores do que a individualidade latente

latejante veia dentro dos copos entre as mãos

beberemos das veias e artérias

cortando o crepúsculo do inferno

sangue jamais contaminado

por valores previamente estipulados


Desse mundo não queremos herança

nos contentamos com algumas palavras

que buscamos nas naturezas sábias


Rimbaud me ilumine

com sua lanterna mágica

Rimbaud me ilumine

mas não me cegue

sigo-te

com o manto da invisibilidade


Baudelaire

teu albatroz vive em mim

um dia vou matá-lo

com meu punhal da sorte

e ele voará

proutro coração


Um coração que nasce sozinho sem raízes

porque pulsa fora da terra, no campo fértil

dos pensamentos livres de espinhos e flores


Coração suspenso que tudo reflete

porque está acima de todas as hipóteses

é apoteose única e indecifrável


No labirinto de heras e nuvens brancas

brandos ventos onde os alados buscam sossego

com olhos puros de alguma coisa não nomeada.

Camila Vardarac, poeta carioca, é formada em Cinema e publicou poemas em sites e revistas eletrônicas como Cronópios e Zunái. Participou do festival literário Artimanhas Poéticas, realizado em 2009 no Real Gabinete Português de Leitura, no Rio de Janeiro.

Nenhum comentário:

Postar um comentário