segunda-feira, 24 de agosto de 2015

POEMAS DE ORIDES FONTELA


AURORA

Rosa, rosas. A primeira cor.
Rosas que os cavalos
esmagam.


DO ECLESIASTES

Há um tempo para
desarmar os presságios

há um tempo para
desamar os frutos

há um tempo para
desviver
o tempo.


REBECA (II)

A moça do cântaro
e
seu
silêncio de água
e de barro.


ESTRELA

A tranquila explosão
fria
fora do tempo e
nos olhos

esplêndida
solitária

no ápice do amor
tremeluzia.


ESFINGE

Não há perguntas. Selvagem
o silêncio cresce, difícil.

HABITAT

O peixe
é a ave
do mar

a ave
o peixe
do ar

e só o
homem
nem peixe nem
ave

não é
daquém
e nem de além
e
nem

o que será
já em nenhum
lugar.


A LOJA (DE RELÓGIOS)

I

O relógio
horologium
a hora
o logos.


II

Os peixes estão
no aquário
o touro está
na balança

e a virgem
parindo
os gêmeos.


III

os relógios estão
na eternidade.


* * *

O branco é campo para o desespero
É quando sem infância persistimos
E nos fita de face a luz sem pausa
Da memória suspensa (tempo em branco).

O branco é luz aberta: existimos
Sem sombra de segredo, sem mais causa
Sem mais infância em nós. É desespero
Nos fixando (puro campo branco).

O branco é branco apenas. Sem refúgio
Insistimos na luz. A luz constrói
A flor em nós (sua rosácea branca).

O branco é campo para a crueldade
Onde nos encontramos: tenso espaço
Na luz vivente (branco apenas).



(FONTELA, Orides. Rosácea. São Paulo: Roswitha Kempf Editores, )

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