Caros, em dezembro de 2007 estive em Buenos Aires, participando de uma edição internacional do evento Encontros de Interrogação, promovido pelo Itaú Cultural, ao lado de poetas e escritores como Marcelino Freire, Nelson de Oliveira, Edson Cruz, Márcio-André e Ricardo Aleixo. Segue abaixo uma breve crônica que escrevi na época:
Fiz um passeio pelo bairro da Recoleta junto com Ricardo Aleixo, Márcio-André (editor da Revista Confraria) e sua esposa, Karina Alves Gulias. Um momento engraçado foi quando Ricardo resolveu gravar minha leitura de Versos Íntimos, de Augusto dos Anjos, dentro de um cemitério (“Vês? Ninguém assistiu ao formidável / Enterro de tua última quimera, / Somente a Ingratidão, esta pantera / Foi tua companheira inseparável”). Depois, ele gravou um depoimento meu, e outro de Márcio-André, sobre as relações entre poesia e sonorização (nada a ver com poesia e música, e sim com o trabalho harmônico e rítmico em cada palavra, frase, estrofe ou bloco de texto, bem como o diálogo entre a música natural das palavras e outros recursos sonoros, não necessariamente melódicos, ou sequer instrumentais.)
Ricardo perguntou-me como eu trabalhava os sons em meus poemas; respondi a ele que buscava tornar o idioma português estranho ao próprio português, pela incorporação de neologismos, arcaísmos, palavras de outros idiomas, como o sânscrito, sons abstratos, além de subverter o sentido habitual das unidades semânticas. Também penso a duração de cada linha como um acorde, e a sucessão das linhas como algo descontínuo, sem unidade rítmica, mas explorando a dissonância e a polirritmia, acentuadas pela diagramação do texto na página. Ele me perguntou como seria um CD de poesia feito por mim; disse a ele que não incluiria canções, ou música incidental, mas faria a declamação dos poemas, realçando o timbre e a duração de cada palavra. Ele fez várias observações interessantes (uma pena que não gravamos toda a conversa!), como a inclusão, nesse CD hipotético, de ruídos do ambiente externo, sons produzidos por objetos, entre outros, não como “acompanhamento”, mas sim como ruído e tensão. Se um dia eu produzir esse hipotético livro sonoro (também falamos sobre a necessidade de atualizar o conceito de “livro”, para além do objeto guttemberguiano), com certeza, vou chamá-lo para trabalhar comigo nesse projeto. Aliás, Ricardo, que apresentou uma bela performance poético-sonoro-visual em Buenos Aires, dará uma oficina sobre o tema na Casa das Rosas, em janeiro, aguardem informações sobre isso na Pele de Lontra.
Outro tema que conversei com ele foi sobre a profissionalização do trabalho do escritor, mas voltarei a isso em outra ocasião, pois merece um espaço à parte. Também tive ótimas conversas com o Márcio-André sobre a necessidade de critérios de qualidade para a seleção de autores e textos para publicação numa revista literária (e nesse aspecto a Revista Confraria está de parabéns); com o Claudiney Ferreira, do Itaú Cultural, com o Samuel León, da Iluminuras, com a Camila do Valle, da Funceb, com o Marcelino Freire e a Andréa Del Fuego, entre outros amigos e comparsas, que não irei reproduzir aqui, para não cansar vocês, mas uma coisa é certa: eventos como este são importantes, também para que os criadores possam se reunir e discutir idéias, projetos, parcerias; é desse fermento que surgem muitas realizações. Voltei a São Paulo no dia 07, e desci no aeroporto de Guarulhos já com saudades de tantos bons momentos. Não vou falar dos porres em Los Chilenos, de quem cantou na rua de madrugada, nem de outras questões comprometedoras; o fato é que trabalhamos, sim, e também nos divertimos muito! Besos,
CD
querido claudio daniel: saudade dos muitos papos por lá! abraços, camila do valle
ResponderExcluirMas qual foi mesmo o disparador de memória que te fez voltar esses quase 5 anos??? Um abraço forte, Camila
ResponderExcluirCamila, tudo bem? Foi mesmo um encontro muito agradável! Gostei de conhecê-la pessoalmente, de saber um pouquinho sobre o ótimo trabalho que o Funceb realiza de divulgação da poesia brasileira, além, é claro, dos passeios por Buenos Aires e das conversas com os amigos. Foi mesmo um momento inesquecível, que está sempre na minha memória -- assim como a visita que fiz a Portugal, em 2010, que mw permitiu conhecer poetas portugueses e africanos de língua portuguesa. Momentos especiais, como estes, não precisam de motivo para serem celebrados, concorda? Aliás, se você estiver em Sampa City, venha me visitar no Centro Cultural São Paulo!
ResponderExcluirBeso,
Claudio