quarta-feira, 5 de agosto de 2009

A ARTE NÃO É UM ESPELHO QUE REFLETE A REALIDADE

Wilmar Silva publicou uma reunião de seus livros de poesia pela editora portuguesa Cosmorama. O volume, intitulado Yguarani, é um dos mais originais que li nos últimos tempos, de autores novos. Jorge Melícias escreveu a respeito um interessante ensaio, onde afirma: “toda a poética de Wilmar Silva é, na verdadeira acepção da palavra, uma experiência de limite. O carácter extremamente inovador desta proposta (e aqui convocamos todos os movimentos desconstrutivistas de vanguarda que preencheram a história da literatura do último século e, em particular, essa aventura que foi a estética zaúm, avançada por Alexéi Jruchenvj) pode, em última instância, conduzir à incompreensão e ao solipsismo. Mas esse é o derradeiro risco que todo o poeta corre. Um risco assente numa verdadeira e feroz dialéctica, onde a ideia wittgensteiniana de a língua e a realidade serem como dois espelhos pendurados em paredes opostas num quarto vazio foi, sabiamente, treslida. (...) Em última analise voltamos sempre ao inicio: se a língua cria a realidade e a poesia cria a língua, quem cria a poesia? Como Charles Bernstein defende: ‘À igualdade quando a diferença nos descrimina prefiro sempre a diferença quando a igualdade nos anula’. A poesia de Wilmar Silva leva essa utopia às últimas consequências. Soube ler, talvez com a coragem de poucos, essa máxima de Maiakovski, ‘a arte não é um espelho que reflecte a realidade, mas um martelo que a forja’, lutando, na feliz expressão de Graça Capinha, ‘contra o corpo da linguagem por uma linguagem que há-de, por força, ser outro corpo’”.


Leiam abaixo alguns poemas de Yguarani:


letra n

ninfas excapão da luanuvi
duendis orfeu, o tocador-
canta e rebati longinquo
arabescos q mi bordália
nasc dríade, av magma:

letra o

em pêlunu bosq dansol
ao redor dos carvalios
cabeleras q rubru ao ar-
ispaduas achas i coros d
folias, madona q corôo

letra q

luzmio brenha i perfaru
tua receia vinhu eclipsi
chov mardrugado a-fora
dócio re-sona luminarpéia
v a lua i colorew auroras

(Poemas do livro Yguarani. Maia: Cosmorama Edições, 2009)


10 comentários:

  1. [Yguarani] linguagem das águas onde o que há de sólido é liquido e é língua e radar. Viva Yguarani.

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  2. a poesia do wilmar é uma língua própria! seu idioleto sua mania. sua lida com as palavras é instintiva, primordial e consciente de sua falibilidade: palavras-coisas.

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  3. Inventor à vista?!
    Adorei, Claudio, já estou mandando buscar
    |wil-ma rr sil,vaa|h!
    ;-)

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  4. Valquíria12.8.09

    Quem é Wilmar Silva?! Gostaria de conhecer os seus mistérios. Aquilo que ele recusa-se em dizer e diz, em uma linguagem que é inasssscesssssível aos homens, compreensível apenas aos tantos poetas que conhecem o segredo de poetar, aqueles que não se lembram do "Macaco Azul" quando escrevem e por isso mesmo se tornaram grandes inventores da língua. Pessoas desprendidas da realidade, viajantes do tempo/ espaço, protagonistas da própria história. Valquíria

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  5. Valquíria, o Wilmar é um poeta de Belo Horizonte, tem vários livros publicados, você pode achar textos dele via Google, ou na Zunái. Poetas inventivos não são desprendidos da realidade, eles criam novas realidades... beso,

    CD

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  6. Instigante. Mas acho que o Gullar já fazia algo parecido em "A luta corporal", de 1954.

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  7. Anônimo4.10.09

    Ferreira Irregullar, vc quer dizer

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  8. Irre-gullar, ótimo! Abraço,

    CD

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  9. Wilmar Silva é um caso sério.
    Nele a poesia desfaz.

    Abraços,
    Rogerio Santos

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  10. Anônimo15.4.10

    Tive a chance de ler o Yguarani do Wilmar Silva. Ele é um poeta maravilhoso...incrível...
    Andréia Otoni

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