SEDE
O rio, o rio fluía, quieto, na noite. O luar era tão luar,
que do rochedo onde eu estava, pude ver a mulher emergir das profundezas e
nadar de costas até a margem. Ela saiu da água e veio em minha direção,
devagar, gotejando-se no caminho. Parecia que o mundo andava na ponta de seus
pés. Embora eu temesse me afogar na sua sombra, a cada um de seus passos o receio
ia se despedindo de mim. Ao redor, as coisas em excesso pediam licença,
silenciosamente. Estávamos nos esvaziando. Ela movendo-se. Eu, imóvel. Logo,
chegou ao rochedo e se sentou à minha frente. Não recordo o que conversamos,
apenas que não podíamos dar às palavras o contorno que as definiam como
palavras. O céu com suas estrelas, lá de cima, nos observava. Então, abracei-a,
farejando a sua pele, o seu cheiro de água. E, para saciar a minha seca,
comecei a beber, sem pressa, o rio que nela fluía.
(Leiam mais contos de João Anzanello Carrascoza na edição de agosto da Zunái.)
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