Vestida de branco,
Isolda vinha como uma nuvem.
Então a lua começou
a cair envolta em chamas. E nas praias dançava um reflexo de fogo.
Os espectros saem um a um de cada onda que
se levanta. Vocês que estão aí escondidos, chegou a hora de tremer ante a
voracidade da morte.
O sol poente faz uma auréola sobre a cabeça
do último náufrago que flutua à deriva sem ouvir mais os cantos da margem.
Os lobos passeiam com os olhos brilhantes
entre os ramos da noite, enlaçados estreitamente e chorando sem causa precisa.
O homem aquele, maior que os outros, abre a
boca no meio do jardim e começa a tragar vagalumes durante horas inteiras.
As árvores estão retorcidas por causa de
uma dor estranha. E uma quantidade de meteoros que caem do céu formam espirais
em nossa atmosfera como se fossem pedras na água.
O fumo espesso sai de todos os lados. Agora
só brilham os olhos dos lobos e o homem cheio de vagalumes.
Todo o resto é
penumbra.
A montanha abre suas portas e o cego entra
com os braços estendidos.
Há uma árvore, uma grossa árvore que se
retorce no fogo do crepúsculo.
Acima, Deus está embalando um planeta
recém-nascido.
Caem estrelas sobre a terra. Uma após
outra vão caindo centenas de auréolas sobre a terra, algumas sobre certas cabeças...E
nada mais?
Uma ilha de palmeiras surge do mar para os
noivos que passeiam enlaçados.
Algum dia um deles encontrará a cabeça que
havia perdido, imóvel no mesmo lugar em que a perdera.
Quando? Onde? Qual deles?
(. . .)
Todas essas mulheres são árvores ou pedras
de repouso no caminho, talvez desnecessárias.
Garrafas de água ou tonéis de embriaguês
geralmente sem luz própria. Obedecem como as catedrais a um princípio musical.
Cada acorde tem seu correspondente e tudo consiste em saber tocar o ponto do
eco que há de responder. É fácil fazer tecidos de sons e construir um
verdadeiro teto ou magníficas cúpulas para os dias de chuva.
Se o destino permite, podemos abrigarnos
por um tempo e contar os dedos daquela que nos estende os braços.
Logo o fantasma nos obrigará a seguir a
marcha. Saltaremos por cima dos seios palpitantes que são suas cúpulas porque
ela estendida de costas imita um templo. Melhor dizendo, são os templos que
imitam a elas, com suas torres como seios, sua cúpula central como cabeça e sua
porta como querendo imitar o sexo por onde se entra em busca da vida que pulsa
no ventre e por onde deve sair depois a mesma vida.
Porém, nós não temos de aceitar semelhante
imitação nem podemos crer em tal vida. Nesta vida que sai com os olhos vendados
e vai estrelando-se em todas as árvores da paisagem. Só acreditaremos nas flores
que são berços de gigantes, embora saibamos que dentro de cada casulo dorme um
duende.
Vicente Huidobro
Tradução: Claudio Daniel
http://ninaarizzi.blogspot.com.br/2012/02/bale-de-dois-pra-julya-e-huidobro.html
ResponderExcluirhuidobro, um dos maiores poetas do século XX, que, a mim, mas posso estar bem errado, levou adiante o surrealismo,sendo-lhe contemporâneo: manteve-lhe as associações e as "delícias" das associações surreais e acrescentou sentido, um tipo de sentido, ao que, inicialmente, não tinha - ou seja: me parece que manteve a falta de sentido direta, imediata, e desenvolveu um tipo de sentido mais evidente, ainda que talvez não se consiga precisar essa evidência, mas que, com certeza, passar por um tipo de consistência organizacional: manteve as delícias do surpreendente "caótico" com a suavidade, também surpreendente, do caótico não apenas reinventado, mas iluminado por essa aspiração humana, o pensamento, a "tranquilidade da compreensão".bem...
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