DE 26 AFORISMAS SOBRE POESIA
1.
1.
Permanece um mistério o fato de que vivemos em estado permanente de linguagem. A poesia é o instrumento ideal para captar este mistério.
2.
Mu Ga não é parar o pensamento: é perceber o pensamento.
3.
Cada vez mais a persistência da idéia de poesia radical entendida em seu sentido etimológico, do latim radix, raiz, base, fundamento. Uma poesia que investiga sua própria ocorrência, ramificações, vis-à-vis seu encontro com o mundo, indo na raiz do problema: para o poema, esta raiz é a palavra.
4.
A abstração é a natureza da mente, não a mente um reflexo da consciência.
5.
O desafio está em não cair numa metalinguagem barata. Ou solipsismo ("não há nada fora de minha mente"). Ao contrário, o poema é um encontro em nosso território comum, nosso habitat.
6.
Poeta é quem que provoca música com os vocábulos. E afasta a afasia. Certa aversão pela idéia difundida pelo senso-comum da vida (e da poesia) como algo continuo. Poemas são seres vacilantes, como animais, ORGANISMOS, e parecem estar o tempo todo querendo incorporar o caráter fragmentário e material da experiência. Por isso, parecem muitas vezes "incompletos".
7.
Se "poesia é a promessa de uma linguagem" (Hölderlin), então o poema é um não-lugar, uma utopia. Seu sentido é seu movimento.
8.
O poema é um ultraje (outrage), um contra-texto.
9.
De olhos fechados: o universo é vermelho.
10.
Você diz
que não há nada de novo
sob o sol.
Isso pode valer para o sol,
mas não para nós.
(apud Apollinaire)
(...)
15.
Todas as abordagens poéticas (seja através de iluminuras, personas, objetivos correlativos, colagem, simultaneismo, pastiche, ostranenie, ideograma, non-sequitur) desembocam, por operações distintas, na grande questão: o espaço habitado pela poesia enquanto matéria mental, entre palavra e mundo. Entre estar mudo e ser mundo.
16.
O nome do ventríloco era Eulírico. ("Já meu nome é eutro: o intervalo entre palavra e mundo").
17.
O poema nasce enquanto o procuramos.
18.
Como numa história de detetive, o poema, hoje, é um enigma. Seu crime começa já nas primeiras palavras. O poema nada mais é que uma seção de correlatos do sentido suspensos entre pistas falsas, fragmentos de perfis, frustrações de expectativas, que apontam inequivocamente para sua própria aparição & desaparição. O nome dessa luta invisível é o sentido.
(...)
21.
Talvez poemas devessem ser mais que simplesmente escrita sobre experiências, e sim escrita como experiências.
(Leia o texto integral na edição de fevereiro da Zunái)
"O poema é um encontro em nosso território comum, nosso habitat".
ResponderExcluirPerfeito.
Que beleza de texto.