domingo, 27 de janeiro de 2013

POEMAS DE LIMERSON MORALES


A CABEÇA RECOMEÇA

retomei todos os meus compromissos
mas sinto-me omisso a mim mesmo
sinto-me em estado de sumiço.
um espaço na minha cabeça
deixou de ser maciço e isso
parece só o começo
(becos talvez, surjam e desapareçam,
compostos por começos de cabeças
dispostos pelo chão, becos abafados)
mas retomei, hoje sou dois,
e não descanso porque não existo.



ELETROCUTADO

um choque percorre meu eixo e explode em facetas libertárias excretoras de baba

em gotas da escuridão lúbrica tidas como objeto de desejo de uma mata fechada

cada pedra nomeada com designação de parentescos apara as arestas e abraça

ecoa de cada memória escrita um alumbramento expressivo da oralidade

pela suspeita extasiada da ameaça e da presença que tem corpo

o corpo de um instrumento musical intencionado de madeira

uma história que conta, que canta, que dança e silencia

em sua quimérica e efêmera vontade de ruptura

o tigre dos meus ombros desliza pelos dedos

envelhecendo em estado de magia


*

o vento derruba todos os meus objetos. esse trajeto é o seu único gesto. devasta o topo da minha cômoda. eu vejo sem proposições nem esboço de reação. vejo desnudo porque o objeto do vento é o devasso. desejo vendo com os braços tremendo. a caixa também deu os seus passos. quando eu derrubo o sono da cama o dia desliga a câmera. comigo não houve diálogo, ou qualquer forma primariamente reconhecível como código. o sonho do olho aberto derretia objetando o vento. fazia secas casquinhas amarelas. ornamentos das laterais oculares. o relato do ócio objeta assim, o ciclo de um tipo de ar. arder o ciclo do amanhecido dia impondo da ode estereotipada a qualquer traço mais elaborado que o primitivismo ostracismo enraivecido.

*

Hoje, quando comecei a escrever, começaram a brotar em mim um par de seios. Pequenos, onde ficam os meus mamilos. Com pelos ao redor do bico. Então pensei, uma metáfora glandular. E a ironia velada levou-me a mão a um deles. Escrevia a palavra língua sem escorrer-me o sangue dos seus personagens pela minha boca. Excitei-me acariciando o entorno com os dedos nas costelas. A explosão venosa e arterial em transito amplificada foi assim para todo o meu corpo.

*

Vê como desmancha conforme eu digo que a sombra da lâmpada dá uma dor ruim na bexiga. Na palma da mão direita cresce uma mexa ruiva que esvoaça quando a mão que escolhe o cacho acena a luva. Vê como desleixam e gingam da quinta-feira que fugia enquanto caía tua bolsinha de moedas. No pátio de aplicação de flúor encontram-se reunidos pais e mestres mantendo os canais e os níveis vocais em silêncio. Vê como desmancha tudo conforme as plantas atrás do espelho hoje quando amanheceram nutriram luzes no reflexo. Ao quebrar a xícara diária da história maciça encontrei o remédio da diurese anamnéstica.


Leia mais poemas de Limerson Morales na edição de fevereiro da Zunái.