sábado, 18 de maio de 2013

DOIS POEMAS DE RAUL BOPP


IV

  
Esta é a floresta de hálito podre
parindo cobras.

Rios magros obrigados a trabalhar
A correnteza se arrepia
descascando as margens gosmentas

Raízes desdentadas mastigam lodo

Num estirão alagado
o charco engole a água do igarapé

Fede
O vento mudou de lugar

Um assobio assusta as árvores
Silêncio se machucou

Cai lá adiante um pedaço de pau seco:
Pum

Um berro atravessa a floresta
Chegam outras vozes

O rio se engasgou num barrento

Espia-me um sapo sapo
Aqui tem cheiro de gente
— Quem é você?

— Sou a Cobra Norato

Vou me amasiar com a filha da rainha Luzia.


VII 

Ai! Tenho pressa. Vou andando
Furo tabocas
Onde estou?

Árvores de galhos idiotas me espiam
Águas defuntas estão esperando a hora de apodrecer

Escorrego por um labirinto
com árvores prenhas sentadas no escuro
Raízes com fome mordem o chão

Carobas sujas levantam os vestidos
como cachos de lama pingando

Açaís pernaltas
movem as folhas lentas no ar pesado
como pernas de aranha espetadas num caule

Miritis abrem os grandes leques vagarosos

Sapo sozinho chama chuva

No fundo
uma lâmina rápida risca o mato
Trovãozinho roncou: já vou

Vem de longe
um trovão de voz grossa resmungando
Abre um pedaço do céu
Desabam paredões estrondando no escuro
Arvorezinhas sonham tempestades...

A sombra vai comendo devagarzinho uns horizontes inchados

(Poemas de Raul Bopp, do livro genial Cobra Norato)

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