IV
Esta é a floresta de hálito podre
parindo cobras.
Rios magros obrigados a trabalhar
A correnteza se arrepia
descascando as margens gosmentas
Raízes desdentadas mastigam lodo
Num estirão alagado
o charco engole a água do igarapé
Fede
O vento mudou de lugar
Um assobio assusta as árvores
Silêncio se machucou
Cai lá adiante um pedaço de pau seco:
Pum
Um berro atravessa a floresta
Chegam outras vozes
O rio se engasgou num barrento
Espia-me um sapo sapo
Aqui tem cheiro de gente
— Quem é você?
— Sou a Cobra Norato
Vou me amasiar com a filha da rainha Luzia.
VII
Ai! Tenho pressa. Vou andando
Furo tabocas
Onde estou?
Árvores de galhos idiotas me espiam
Águas defuntas estão esperando a hora de apodrecer
Escorrego por um labirinto
com árvores prenhas sentadas no escuro
Raízes com fome mordem o chão
Carobas sujas levantam os vestidos
como cachos de lama pingando
Açaís pernaltas
movem as folhas lentas no ar pesado
como pernas de aranha espetadas num caule
Miritis abrem os grandes leques vagarosos
Sapo sozinho chama chuva
No fundo
uma lâmina rápida risca o mato
Trovãozinho roncou: já vou
Vem de longe
um trovão de voz grossa resmungando
Abre um pedaço do céu
Desabam paredões estrondando no escuro
Arvorezinhas sonham tempestades...
A sombra vai comendo devagarzinho uns horizontes inchados
(Poemas de Raul Bopp, do livro genial Cobra Norato)
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