A fascinação pelo monstruoso, irregular ou disforme, evidente nas vanguardas históricas, e em especial o cubismo e o surrealismo, corresponde, segundo Izabela Leal, a “um projeto da modernidade que tem como objetivo tomar o corpo como possibilidade de desumanização” (LEAL, 2009). A estratégia de intervenção artística pela metamorfose e deformação teve certamente os seus antecessores na poesia do século XIX, e em especial nos autores que leram Charles Baudelaire, como o Cesário Verde de Num bairro moderno (“descobria uma cabeça numa melancia/ e nuns repolhos seios injetados”) e o Lautréamont de Cantos de Maldoror, obra inclassificável nos gêneros literários tradicionais que apresenta figuras híbridas meio humanas, meio animais, meio sobrenaturais, como o homem com cabeça de pelicano, “belo como os dois longos filamentos tentaculiformes de um inseto” (LAUTRÉAMONT: 1997, 28).
O processo da metamorfose, em Helder como em Lautréamont, está atrelado “a um desejo de levar às últimas consequências a compreensão da criação poética como uma operação de desestabilização do sentido”: ao desfigurar – ou refabular – palavra e mundo, o poeta cria novas realidades, realidades estéticas, usando como principal recurso criativo a inusitada associação de imagens. Conforme escreveu Pierre Reverdy, a imagem poética “não pode nascer de uma comparação, mas da aproximação de duas realidades mais ou menos afastadas. Quanto mais as relações das duas realidades forem distantes e justas, tanto mais a imagem será forte, mais força emotiva e realidade poética ela terá” (in PIVA, 2005: 150-51). Esta ideia, que é central no surrealismo e também no futurismo – Marinetti afirmou que “a analogia é nada mais do que o amor profundo que associa coisas distantes, aparentemente diversas e hostis” – (PERLOFF, 1993: 117) deriva do Maneirismo e do Barroco, como bem observou Gustav Hocke em seu livro Homo ludens. A lírica transtornada de Herberto Helder pertence a essa estranha família composta de artistas e poetas para quem “o que importa não é a representação da realidade, mas sim a criação de uma realidade nova que se produz através de uma transfiguração dos objetos, da perda de seu sentido usual”, (Leal, 2009). É a partir destes vetores conceituais que iremos agora comentar o poema Lugar, de Herberto Helder.
O processo da metamorfose, em Helder como em Lautréamont, está atrelado “a um desejo de levar às últimas consequências a compreensão da criação poética como uma operação de desestabilização do sentido”: ao desfigurar – ou refabular – palavra e mundo, o poeta cria novas realidades, realidades estéticas, usando como principal recurso criativo a inusitada associação de imagens. Conforme escreveu Pierre Reverdy, a imagem poética “não pode nascer de uma comparação, mas da aproximação de duas realidades mais ou menos afastadas. Quanto mais as relações das duas realidades forem distantes e justas, tanto mais a imagem será forte, mais força emotiva e realidade poética ela terá” (in PIVA, 2005: 150-51). Esta ideia, que é central no surrealismo e também no futurismo – Marinetti afirmou que “a analogia é nada mais do que o amor profundo que associa coisas distantes, aparentemente diversas e hostis” – (PERLOFF, 1993: 117) deriva do Maneirismo e do Barroco, como bem observou Gustav Hocke em seu livro Homo ludens. A lírica transtornada de Herberto Helder pertence a essa estranha família composta de artistas e poetas para quem “o que importa não é a representação da realidade, mas sim a criação de uma realidade nova que se produz através de uma transfiguração dos objetos, da perda de seu sentido usual”, (Leal, 2009). É a partir destes vetores conceituais que iremos agora comentar o poema Lugar, de Herberto Helder.
(CONTINUA)
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