INTERLUNAR
Entre nuvens cruéis de púrpura e gerânio,
rubro como, de sangue, um hoplita messênio
o Sol, vencido, desce o planalto de urânio
do ocaso, na mudez de uni recolhido essênio...
Veloz como um corcel, voando num mito hircânio,
tremente, esvai-se a luz no leve oxigênio
da tarde, que me evoca os olhos de Estefânio
Mallarmé, sob a unção da tristeza e do gênio!
O ônix das sombras cresce ao trágico declínio
do dia em que, a lembrar piratas do mar Jônio,
põe, no ocaso, clarões vermelhos de assassínio...
Vem a noite e, lembrando os Montes do Infortúnio,
vara o estranho solar da Morte e do Demônio
com as torres medievais as sombras do Interlúnio...
SATÃ
Nas margens de cristal do Danúbio do sonho,
cromadas de rubis, de pérolas purpúreas,
vê-se o imenso solar sonolento e medonho
do dragão infernal das Princesas espúrias...
Guarda o nobre portal de alabastro tristonho
desse antigo solar, de malditas luxúrias,
em que fulge o brasão heráldico do sonho
não sei quantas legiões de duendes e fúrias!
Sobre o mármore azul das colunas austeras,
que, em noivados de luz, o luar engrinalda
brilha o vivo cristal de alígeras quimeras...
Velam desse dragão o oriental tesoiro,
sobre um trono de rei, de maciça esmeralda,
dois soberbos leões, de grandes patas de oiro...
EQUATORIAL
Bóiam verdes lodões no lago quieto em frissos
de topázio. Flechando as ralas talagarças
dos ramos vibram, no ar, os vírides caniços
dos juncos. Funde a luz as nuvens de oiro esgarças.
Sobre o lodo escorrega o musgo a renda. Em viços
soberbos, o esplendor das aquáticas sarças
beira o líquido espelho em que, de espantadiços
olhos, banham-se, ao sol, as branquicentas garças.
Trapejam no horizonte uns trêmulos farrapos
de púrpura. Banando, entre os juncos, disformes
de luxúria, a coaxar, pulam, glabros, os sapos.
E, na lama, que a lesma azul meandra de rugas,
rojando-se em espirais de gelatina, enormes
arrastam-se, pulsando, as moles sanguessugas...
Maranhão Sobrinho (1879-1915) "foi o mais considerável poeta do seu tempo, no extremo Norte, e o simbolista ortodoxo, o satanista por excelência do movimento naquela região", segundo o crítico Andrade Murici.
ResponderExcluire há quem fale contra o soneto. ignora-se que poesia é sílaba, palavra, verso (ou não verso), e não métrica e rima (em segundo plano, afinal, o gol é só um detalhe). basta ver o nosso maranhão sobrinho para também se esclarecer sem maiores aporrinhações: é quando se corre risco que se garimpa algo na poesia. olhem-se certas palavras que o poeta usou nos três sonetos para dimensionar o tamanho do risco e, por ter sobrevivido, a qualidade dos versos. cem anos - cem anos! - atrás. pensar que, hoje, tem tanta gente que não entendeu que ser poeta é arriscar o pescoço e continuar vivo. como o nosso maranhão continua vivíssimo.
ResponderExcluirCaro Edson, confesso a você que não me interesso pelo soneto como soneto, mas pela poesia como poesia... versos admiráveis como estes transcendem qualquer gênero ou formato... o que conta, no final, é o talento e capacidade do poeta... abraço,
ResponderExcluirCD
vindo aqui pela mao de claudio daniel.
ResponderExcluirElaine Pauvolid
www.jokasta.org
Amigos, Maranhão Sobrinho e suas obras (conforme Blake) estão cadastrados em nossa biblioteca digital de autores brasileiros, aqui: http://www.literaturabrasileira.ufsc.br/autores/?id=2151. Agradeceria muito se vocês puderem me passar uma referência bibliográfica de edição impressa confiável a partir da qual pudéssemos conferir o conteúdo das obras desse escritos. Meu e-mail: tudosimples@gmail.com. Abraços, Tony.
ResponderExcluirTony, infelizmente, não conheço nenhuma edição impressa de Maranhão Sobrinho; talvez na Biblioteca Mário de Andrade, em São Paulo, haja algums coisa. Vou checar o teu link!
ResponderExcluirAbraço,
Claudio