CHINA
NUNCA, olho-
do-mistério,
cauda de pavão.
Larva, nem crisálida;
onde pousa, branca,
em que pétala,
asas em qual flor,
abelha, se o aroma?
O que retine ao sol,
vibra — folha de
peônia —, dedo não
é lua, nem há pó
ou espelho; Cathay,
tudo é vazio, mas
olhe, tanta beleza
e sopra o vento
de outono.
ÍNDIA
SÓ A LOUCURA.
Vem, do púbis
às omoplatas,
canta o antigo
sol, sua face
de flama animal
raiando desejosa.
Flor de sândalo,
diz ao tempo:
agora é sempre,
fecha tua asa,
expira em fumo
e cobre. Vêm,
Lakshmi-Naráyana,
flagelar o medo,
fustigar a sílaba
muda, para o
tempo de cristal.
1999
(Do livro A Sombra do Leopardo)
o poema sobre a china, em seda, em pétala, em cor, com o clima final de haicai, é intocável: ao tempo, também um buquê de bambus.
ResponderExcluirDeste núcleo de Sombra, China é meu favorito. A leitura sugere um caminhar para trás, de costas, de ré: "Larva, nem crisálida; / onde pousa, branca, / em que pétala, / asas em qual flor, / abelha, se o aroma?".
ResponderExcluirO "NUNCA" do início puxa tudo para trás. É um poema em pleno processo de engolição de si mesmo.
Gosto muito!
Abraços,
M. Luíza
Maria Luiza, grato pelo comentário! Sim, a sintaxe do poema é fraturada, elíptica, mais rítmica do que que gramatical. Há também aqui a citação de imagens clássicas da poesia chinesa. Gostei de tua leitura / interpretação, confesso que nunca pensei nessa possibilidade (rsss), às vezes o leitor ajuda o poeta a compreender o seu poema (raras vezes entendo o que eu escrevo...).
ResponderExcluirBeso,
Cld.