quinta-feira, 5 de agosto de 2010
TRÊS POEMAS DE KHLÉBNIKOV
TREVAS
Quando não aguento mais o tédio,
Saio para o sol em disparada,
Asa esvoaçando pelo éter,
A virtude e o vício misturados.
Morro, eu morro, o sangue escorre a cântaros
Na couraça do meu corpo.
Caio em mim – e então, de novo,
Só enxergo a guerra em teu olhar.
1907 - 1914
CANÇÃO DE UM CONFUSO
Eu, na pintura de pedra,
Vejo agulhas de pinheiro.
Desossada me parece aquela mão,
Quando bate violenta em minha entranha.
Mas tão cedo assim? Estranho o hóspede
Que adentrou a casa ao pôr-do-sol:
Esqueleto erguendo lento os longos braços,
Para encher de estrelas a sala de estar.
1913
* * *
A noite, coalhada de constelações.
Que destinos, considerações,
Brilhas, livro, na amplidão do escuro
Fundo? Liberdade ou jugo?
Qual a parte que me cabe deste
Latifúndio-céu de estrelas?
1912
Tradução: André Vallias
Velimir Khlébnikov (1885-1922), poeta russo, foi um dos mais inventivos autores do século XX, segundo Roman Jakobson. Mentor da vanguarda cubo-futurista, criou a linguagem zaúm, ou transmental, formada por sons abstratos. Simpático à revolução socialista, participou da campanha do Exército Vermelho na Pérsia, em 1921. De volta à Moscou, enfrentou a miséria, a doença e a fome. Sua morte foi ignorada pelas autoridades oficiais. Apenas em 1928 suas obras completas foram publicadas, em cinco volumes. Por muito tempo, seu nome ficou de fora das enciclopédias e da história da literatura, pela censura estética do stalinismo, mas hoje é reconhecido como um dos principais renovadores da literatura russa. No Brasil, vários de seus poemas foram traduzidos por Augusto e Haroldo de Campos e Boris Schnaiderman, na antologia Poesia Russa Moderna, além da prosa de ficção Ka,traduzida por Aurora Bernardini.
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