segunda-feira, 7 de junho de 2010
RELENDO FIAMA HASSE PAIS BRANDÃO (II)
GRAFIA 1
Água significa ave
se
a sílaba é uma pedra álgida
sobre o equilíbrio dos olhos
se
as palavras são densas de sangue
e despem objectos
se
o tamanho deste vento é um triângulo na água
o tamanho da ave é um rio demorado
onde
as mãos derrubam arestas
a palavra principia
GRAFIA 2
Está no rio
o embrião da noite
O rio livre
com apenas o princípio evidente
de todas as formas
A água íntima dos lábios
TEMA 1
Nenhuma ave é central
Multiplico
teus límpios meteoros
nas esplanadas
e sono
denso ventre com febre túneis
cidade úbere de flancos intermináveis
Sequer uma ave subterrânea
em teus olhos rectilíneos
tuas vidraças com pausas para a morte
tuas mãos demolidas
teu vasto sexo desvendado de alicerces
TEMA 4
Nenhum sinal nos calcina as órbitas
Voluntários
somos de frente com a imagem
na grafia dos espelhos
Um teorema de pálpebras nos situa
imunes
à cicatriz dos limites
que bebemos
Um sismo incontém nossos ombros fechados
Limítrofes
os nossos pés anfíbios
invocam o rio
(Do livro Morfismos, 1961.)
Prezado Prof. Claudio Daniel
ResponderExcluirOs poemas da Fiama são bastante desafiadores a quem se pretende buscar uma interpretação/sentimento em seu verso. Continue publicando poemas da autora e através de maior familiaridade de sua estética, penso que se tornará mais próxima.
Att
Caro Celso, a Fiama privilegia o significante, a função poética, sobre a emoção e o sentido, em especial neste livro, talvez o mais construtivista de sua obra (e que se aproxima de João Cabral e da Poesia Concreta). Porém, sua obra é imensa e tem várias facetas, com diferentes resultados formais. Vou publicar aqui, aos poucos, algumas dessas facetas. Fiama, Luiza Neto Jorge e Ana Hatherly são as três grandes poetas portuguesas da segunda metade do século 20 e início do 21.
ResponderExcluirA vanguarda poética em Portugal, na década de 1960, agrupou-se em duas vertentes, a Poesia 61 (Fiama Hasse Pais Brandão, Gastão Cruz, Luiza Neto Jorge e outros poetas) e a PO-EX (Poesia Experimental Portuguesa, liderada por Ana Hatherly e E. M. de Melo e Castro). As duas vertentes têm afinidades com o construtivismo de João Cabral de Melo Neto e com a Poesia Concreta, mas com algumas diferenças importantes: os portugueses dialogavam com o surrealismo, com o barroco histórico, empregavam metáforas e formas abstratas, por vezes tornando o sentido rarefeito, enquanto os poetas brasileiros optaram pela objetividade e precisão do sentido. Há mais subjetividade e ambiguidade na poesia portuguesa.
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