terça-feira, 24 de novembro de 2009
TRÊS POEMAS DE AIMÉ CÉSAIRE
SOL SERPENTE
Sol serpente olho fascinando o meu olho
e o mar miserável de ilhas crepitando nos dedos das rosas
lança-chamas e o meu corpo intacto de fulminado
a água exalta as carcaças de luz perdidas no corredor sem pompa
dos turbilhões de gelo em pedaços aureolam o coração fumegante dos corvos
nossos corações
é a voz dos raios cativados girando sobre seus gonzos de camaleoa
transmissão de anolis à paisagem de vidros quebrados são
as flores vampiras na troca das orquídeas
elixir do fogo central
fogo justo fogo mangueira de noite coberta de abelhas meu
desejo um acaso de tigres surpresos nos enxofres mas o despertar
estanhoso dá jazidas infantis
e o meu corpo de seixo comendo peixe comendo
pombas e sonos
o açúcar da palavra Brasil no fundo do pântano.
MITOLOGIA
em amplos golpes de espada de sisal dos teus braços selvagens
em grandes golpes selvagens dos teus braços livres de amassar o amor a teu grado batéké
dos teus braços de receptação e de dom que batem com clarividência os espaços cegos banhados por pássaros
profiro ao vão linhoso da vaga infantil dos teus seios o jorro do grande mapu
nascido do teu sexo onde pende o fruto frágil da liberdade
TOTEM
De longe ao perto de perto ao longe o sistro dos circuncisos e um sol sem modos
bebe na glória do meu peito um grande gole de vinho tinto e de moscas
como de piso em piso de destreza em herança o totem
não saltaria ao topo dos buildings sua tepidez de chaminé e de traição?
como a distração salgada de tua língua destruidora
como o vinho de teu veneno
como teu riso de costas de marsuíno na prata do naufrágio
como a ratazana verde que nasce da bela água cativa de tuas pálpebras
como a corrida das gazelas de sal fino da neve sobre a cabeça selvagem das mulheres e do abismo
como os grandes estames de teus lábios no filete azul do continente
como o resplendor de fogo do minuto na trama serrada do tempo
como a cabeleira de giesta que se obstina a brotar em fim de outono de teus olhos de marina
cavalos da quadriga pisem a savana de minha palavra vasta aberta
do branco ao fulvo
há os soluços o silêncio o mar vermelho e a noite
Tradução: Eclair Antonio Almeida Filho
Leiam mais poemas de Aimé Césaire na edição de dezembro da Zunái...
ResponderExcluirCD
Aimé Fernand David Césaire (Basse-Pointe, Martinica, 1913 — Fort-de-France, 2008), poeta e político francês. Criou o conceito de negritude. Sua obra é marcada pela defesa das raízes africanas. Foi presidente da câmara de Fort-de-France entre 1945 e 2001. Publicou os livros de poesia Cahier d'un retour au pays natal (1939), Les Armes miraculeuses (1946), Soleil cou coupé (1947), Corps perdu (com desenhos de Picasso, 1950), Ferrements (1960), Cadastre, (1961), Moi, laminaire (1982) e La Poésie (1994)
ResponderExcluirAmo Aimé Césaire. O conheci recentemente, na verdade. Gamei.
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