quarta-feira, 22 de julho de 2009
DO LIVRO POETA EM NOVA YORK (XI)
PAISAGEM DA MULTIDÃO QUE URINA
(Noturno de Battery Place)
Ficaram sozinhos:
aguardavam a velocidade das últimas bicicletas.
Ficaram sozinhas:
esperavam a morte de um menino no veleiro japonês.
Ficaram, sozinhos e sozinhas,
sonhando com os bicos abertos dos pássaros agonizantes,
com o agudo guarda-sol que espeta
o sapo recém-esmagado,
sob um silêncio com mil orelhas
e diminutas bocas de água
nos desfiladeiros que resistem
ao ataque violento da lua.
O menino do veleiro chorava e quebravam-se os corações
angustiados pelo testemunho e vigília de todas as coisas
e porque no solo celeste de negros caminhos
ainda gritavam nomes escuros, salivas e rádios de níquel.
Não importa que o menino cale quando lhe cravam o último alfinete,
não importa a derrota da brisa na corola do algodão,
porque há um mundo da morte com marinheiros definitivos
que assomarão aos arcos e os congelarão por trás das árvores.
É inútil buscar o ângulo
onde a noite esquece sua viagem
e espiar um silêncio que não tenha
trajes rotos e cascas e pranto,
porque apenas o diminuto banquete da aranha
basta para romper o equilíbrio de todo o céu.
Não há remédio para o gemido do veleiro japonês,
nem para estas pessoas ocultas que tropeçam nas esquinas.
O campo morde sua cauda para unir as raízes em um ponto
e o novelo busca pela grama sua ânsia de longitude insatisfeita.
A lua! Os policiais! As sirenes dos transatlânticos!
Fachadas de crina, de fumo, anêmonas; luvas de borracha.
Tudo está roído pela noite,
de pernas abertas sobre os terraços.
Tudo está roído pelos tíbios tubos
de uma terrível fonte silenciosa.
Oh pessoas! Oh mulherzinhas! Oh soldados!
Será preciso viajar pelos olhos dos idiotas,
campos livres onde silvam as mansas cobras deslumbradas,
paisagens cheias de sepulcros que produzem fresquíssimas maçãs,
para que venha a luz desmedida
que temem os ricos por trás de suas lupas,
o olor de um só corpo com a dupla vertente de lis e ratazana
e para que se queimem estas pessoas que podem urinar ao redor de um gemido
ou nos cristais onde se compreendem as ondas nunca repetidas.
Tradução: Claudio Daniel.
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